A imprensa paulista deu destaque esta semana para dois projetos do governo estadual que prometem revolucionar a vida da população. Um deles faz parte da antiga (e já longamente discutida) idéia de revitalizar o Rio Tietê: seria construir parques nas margens do rio, com árvores e demais atrativos para as pessoas se sentirem confortáveis. O outro projeto, mais a longo prazo, seria o que está sendo chamado de “rodobarco” – uma alusão ao rodoanel, que está circundando aos poucos a periferia da capital paulista. Agora, o “círculo” seria formado pelos dois principais rios que atravessam a cidade (Tietê e Pinheiros), interligando-os às diversas represas e lagos que se espalham em torno. Haveria então um sistema de transporte público fluvial, permitindo ir, digamos, da Zona Norte à Zona Sul, em tempo bem mais curto do que o que se gasta hoje, mesmo de automóvel.

Comento as duas notícias a propósito de um congresso que acaba de acontecer nos EUA, patrocinado pela revista Fortune, sobre o tema “cidades inteligentes“. Especialistas de diversas empresas e do governo americano exibiram suas teses sobre o uso adequado da tecnologia para tornar melhor o padrão de vida nas grandes cidades. Um deles deu este dado: embora ocupem apenas 2% do território mundial, as grandes áreas urbanas são responsáveis por 75% das emisões de gás no mundo atual. Outra revelação espantosa: até 2025, haverá no mundo mais de 200 cidades com população superior a 1 milhão de habitantes.

Teoricamente, a tecnologia de hoje poderia ajudar (e muito) a tornar esses aglomerados urbanos mais habitáveis. Mas, será que as empresas estão preparadas para isso? Não, foi a conclusão unânime dos participantes. “O modelo de negócio da indústria hoje é baseado na complexidade”, resumiu Greg Papadopoulos, diretor de tecnologia da Sun Microsystems. “A tecnologia se sustenta na troca constante de produtos, em ganhar dinheiro com as atualizações. O consumidor não aceita mais isso. Falhamos miseravelmente, pois os aparelhos continuam complicados e funcionando mal. Se não mudarmos esse modelo, seremos sempre amaldiçoados”.

Uma belíssima confissão de culpa, partindo de um legítimo representante da indústria eletrônica. Tenho conversado regularmente com executivos do setor, e sempre ouço a mesma conversa: os produtos têm que ser complexos (ou pelo menos dar essa impressão), caso contrário o consumidor não os valoriza. “Ele concorda até em pagar mais caro por recursos que jamais irá usar”, me disse um desses executivos outro dia. Pode até ser, mas a declaração do diretor da Sun coloca em xeque esse conceito.

Esse tema, portanto, precisa ser melhor discutido. Mas, voltando à questão das cidades inteligentes, fica difícil imaginá-las quando nem a própria indústria – a quem cabe criar os tais “produtos inteligentes” – admite seu fracasso.

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