Como prometido, volto ao evento de ontem da Sky, para comentar algumas declarações do presidente da empresa, Luiz Eduardo Baptista. Figura polêmica do mercado (alguns o detestam), ‘Bap’ – como costuma ser chamado – é também um executivo respeitado e um dos que mais entendem, no Brasil, do negócio chamado televisão. Uma de suas marcas é a informalidade pessoal: diz sempre o que pensa, seja numa conversa ao pé do ouvido, seja numa entrevista coletiva – e é por isso, aliás, que não costuma atender jornalistas. É um perigo!

Anotei alguns trechos do que Bap falou ontem e os reproduzo aqui, sinteticamente, pois acho que merecem reflexão. Os leitores que nos acompanham hão de perceber que muitas de suas opiniões já foram externadas aqui neste blog. Pode-se não gostar do tom ou da contundência, mas são pontos de vista que merecem ser analisados atentamente. Acompanhem:

Sky vs. Netflix – Quase toda a mídia vem ressaltando a disputa entre as duas empresas. Mas são dois projetos muito diferentes, e Bap sabe que a Sky não tem como competir com a oferta de títulos da empresa americana. Seu trunfo é conhecer melhor o consumidor brasileiro, graças a pesquisas contínuas sobre seus hábitos. “Sei exatamente o que cada assinante nosso assiste, quando e quantas vezes”, diz ele. “Essa história de 10 mil títulos é muito bonita, mas na prática são pouquíssimos os filmes que as pessoas assistem. Dois ou três, no máximo, num fim de semana. E todo mundo assiste aos mesmos! Nosso desafio é oferecer sempre conteúdos relevantes, ainda que não sejam muitos. Em breve, teremos novidades da HBO, do Telecine e de outras programadoras que estamos negociando.”

Obs.: o Sky Online começa com cerca de 1.000 títulos, contra os propalados 10 mil da Netflix e mais de 20 mil da NetMovies.

TV paga x teles? – Por não ter como oferecer banda larga em alta escala, como as concorrentes Net/Embratel e Telefônica, a Sky se concentra no produto chamado “entretenimento”. Seja através de seus famosos pacotes, via pay-per-view ou video-on-demand, seu produto básico é a oferta de filmes, shows, séries, esporte e tudo mais que o usuário de TV por assinatura busca. “Não temos cacife para competir com as teles. Lançamos a banda larga como um projeto-piloto em Brasilia, e vamos estudar bem antes de expandir para outras regiões, até porque dependemos das licenças da Anatel.”

TV em todo lugar – Bap diz que a Sky ainda não oferece a chamada TV Everywhere, mas que isso está nos planos. “Dependemos de mudanças nos contratos que temos com as programadoras. E, ao contrário de outros, gostamos de respeitar os contratos… Mas a TV Everywhere é uma evolução natural do nosso negócio. Começamos agora levando nosso conteúdo para o computador, que representa 95% dos acessos de internet para ver filmes; depois iremos para o iPad, que é a segunda plataforma mais usada no Brasil; depois, smartphones e TVs conectados.”

Assinantes x não assinantes – Por que lançar um serviço que somente assinantes podem acessar, quando estes já dispõem de uma infinidade de canais a sua disposição? “Para nós, o assinantes sempre virá em primeiro lugar. Quando abrirmos o Sky Online para quem não é assinante, este irá pagar mais caro. Temos a obrigação de privilegiar quem compra uma assinatura e confia no nosso serviço. Sabemos bem o que o assinante pensa, fazemos a gestão de nossos conteúdos com base na experiência do assinante. Por isso, também, nossas plataformas estão integradas às redes sociais, pois conseguimos saber o que as pessoas estão falando do nosso produto.”

Quanto custa? – Assinatura de TV no Brasil é cara? “É só fazer as contas: quatro anos atrás, o preço do pacote básico era de R$ 140; hoje, vendemos por R$ 40. Temos que trabalhar com a realidade do país. A economia melhorou, as pessoas têm mais dinheiro para gastar e a TV por assinatura era um desejo de todos. Mas tem que ser um bom serviço, com bons conteúdos. Chegamos hoje a 13,5 milhões de pessoas. Onde estão os 8 milhões de assinantes que a Oi dizia que iria conseguir?”

Obs.: pelos dados mais recentes da Anatel, a Sky possui pouco mais de 3,8 milhões de assinantes, liderando o segmento de DTH (TV paga via satélite); a Via Embratel tem 2,3 milhões e a OiTV, 357 mil. Em 2011, a Sky aumentou sua carteira em quase 1,3 milhão de assinantes, enquanto a Via Embratel ganhou pouco mais de 1,1 milhão.

A polêmica Fox Sports – Depois do conflito público, ainda é possível um acordo entre Sky e o canal americano que está chegando ao país? “Estamos negociando, mas há regras que precisam ser respeitadas. Temos dois canais que eles nos venderam (FX e Speed) que ninguém assiste, essa é que é a verdade. Tinham nos prometido uma série de conteúdos nesses canais, e nada foi feito. Agora, vêm com a mesma conversa… Eles estão desesperados porque precisam exibir a Copa Libertadores. Quando você compra os direitos de um evento, você se compromete com o organizador, que espera ver o evento sendo exibido. Agora, querem nos cobrar 22 vezes mais caro pelo produto e acham que vamos nos curvar a eles? Não é assim que funciona. É como o cara que chega atrasado na festa, sem convite, e quer entrar dando carteirada no porteiro.”

Obs.: extraoficialmente, sabe-se que a Fox Sports está pedindo a Net e Sky o valor de R$ 1,50 mensais para cada assinante, quando normalmente as negociações de grandes eventos giram na casa de R$ 0,10. O cálculo é feito sobre a base de assinantes de cada operadora, ou seja, se são 3 milhões de domicílios recebendo aquele conteúdo o valor mensal pago à programadora seria em torno de R$ 300 mil.

Cotas, cotas, cotas – A Sky foi, até agora, a única empresa do setor que se rebelou publicamente contra a imposição de cotas para conteúdos nacionais na TV por assinatura. A polêmica provocou até um racha na ABTA (Associação Brasileira de TV por Assinatura), que evitou combater a medida. Bap não engoliu até agora. “Foi como a quebra de um cristal. A entidade deveria defender os interesses do seus filiados, e não foi o que aconteceu. Decidimos ir à Justiça contra esse absurdo que são as cotas. Se alguém pensa que isso vai estimular a produção nacional, terá uma grande decepção. O principal resultado será o aumento do preço das assinaturas. Essa coisa de querer impor o conteúdo ao telespectador lembra o que se fazia na antiga União Soviética! Não faz o menor sentido. Vamos à Justiça defender o direito de cada um escolher o que quer ver.”

O diabo chama-se Ancine – Além da política de cotas, o setor de TV por assinatura agora tem de conviver com os novos poderes concedidos à Ancine. Pela nova lei, a Agência pode interferir até na distribuição dos conteúdos entre os canais. “O responsável por mais esse absurdo chama-se Manoel Rangel, que era produtor independente e descobriu uma forma de impor seus interesses no nosso mercado. Você acredita que eles vão querer se meter até nos contratos de compra de direitos? Temos que gritar contra isso. Fomento, para incentivar o cinema brasileiro, é uma coisa. Carimbo da Ancine é outra, bem diferente. Um filme como Tropa de Elite ou Central do Brasil nunca precisou disso. O que eles querem é empurrar produtos de baixa qualidade, na base do carimbo. E ainda ficam com essa história de consulta pública. Isso é pura fachada. Nenhuma consulta pública até hoje trouxe qualquer mudança.”

Obs.: Manoel Rangel é o presidente da Ancine, que está promovendo até o próximo dia 3 de março uma consulta pública sobre a nova legislação.

 

2 thoughts on “Com a boca no trombone

  1. Até certo ponto, gostei deste camarada, principalmente quando se revolta pelo absurdo das cotas de programação e a ridícula Ancine.

    Alguns pontos que achei curiosos:

    “graças a pesquisas contínuas sobre seus hábitos. “Sei exatamente o que cada assinante nosso assiste, quando e quantas vezes”, diz ele”

    Achei engraçado porque essas pesquisas são feitas com um número muito reduzido de clientes e o decoder da sky não tem canal de retorno (pelo menos, por padrão, isso nunca é instalado). Já a Netflix sim, essa sabe exatamente o que cada assinante assiste.

    “o Sky Online começa com cerca de 1.000 títulos, contra os propalados 10 mil da Netflix e mais de 20 mil da NetMovies.”

    Segundo o ótimo blog http://filmes-netflix.blogspot.com/ que cataloga tudo o que a Netflix oferece (já que a empresa não o faz publicamente), o serviço conta com 18.449 vídeos (1.413 títulos), sendo 17.282 episódios de 246 programas de TV e 1.167 filmes e programas, ou seja, não chegaram aos 1.500 títulos ainda. Se a Netmovies tem 20.000, só se for em DVDs e BRs pra locação, online eles estão longe dos 1.500 da Netflix.

    torço para que o precesso da Sky contra as cotas tenha sucesso.

  2. Entendo como “locação on line” a filmes disponibilizados para assistir através da TV, no conforto de um sofá, cujo local é onde se goza dos privilégios de um home theater.
    Em janeiro desse ano, passei pela experiência de assinar a NetMovie. Cancelei a assinatura no mesmo mês, porque não tinha a opção de assistir qualquer título de minha escolha através da TV.
    Os filmes disponibilizados no site só poderiam ser assistidos no computador e a opção para assisitir pela TV eram sempre os mesmos, e ultrapassados (do tempo da vovó) com imagem muito ruim.
    Reclamei inúmeras vezes que os filmes dispostos na programação da operadora também deveriam estar disponibilizados para assistir pela TV e não só pelo computador.

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