Nesta segunda-feira, a Anatel anunciou que está investigando, junto com a Polícia Federal, se operadoras brasileiras de telefonia e internet violaram dados confidenciais de seus clientes. Foi um pedido do Itamaraty, após surgirem suspeitas de que o Brasil – assim como vários outros países – teria sido incluído no esquema de espionagem da NSA, agência de segurança americana, conforme denunciou neste fim de semana o jornal O Globo. Tudo na esteira das revelações do hacker Edward Snowden, hoje o homem mais caçado pelo governo dos EUA, e que até este momento continua confinado numa sala reservada do aeroporto de Moscou (de onde só pode sair se conseguir asilo diplomático em outro país).

Não vou me estender sobre as implicações políticas do caso, porque não sou especialista em política, muito menos em espionagem. Mas, até onde sei, a tentativa do governo brasileiro de cobrar explicações dos EUA sobre a violação de telefonemas e emails de brasileiros me parece inútil. Assim como não acredito em resultados práticos da ideia de propor à ONU a criação de “normas para proteger a privacidade de cidadãos em todo o mundo”. Segundo Snowden, os EUA fazem isso há cerca de dez anos, ou seja, antes que qualquer usuário leigo da internet sequer pensasse em invasão de privacidade e outros conceitos que hoje parecem tão abstratos.

Na prática, a possibilidade de espionagem via meios digitais é tão antiga quanto a própria internet. Esta nasceu, como todos devem se lembrar, justamente da necessidade de compartilhar informações, primeiro entre cientistas e órgãos governamentais, depois entre pesquisadores e universidades, história que conto em detalhes no livro “Os Visionários“. Tudo ia bem até surgirem Google, Facebook, Amazon, Yahoo, Apple e outros seguidores da filosofia Big Brother – este, aliás, mais antigo ainda, pois era o personagem central de 1984, livro profético do inglês George Orwell, escrito em 1948. Se permite gravar, copiar e distribuir textos, fotos, vídeos e o que mais você quiser, e se transporta uma enormidade de vírus entre um computador e outro, por que a internet haveria de ser imune à ação de profissionais que são pagos justamente para espionar?

O caso Snowden – que tem tudo para se transformar em filme já, já – pode servir de pretexto às mais delirantes e hipócritas acusações entre governantes. Mas querer negar o poder “invasor” da internet na vida dos usuários é, acima de tudo, uma estupidez. Os EUA são o país que mais pratica esse tipo dissimulado de investigação simplesmente porque foi lá que nasceu a internet e é lá que estão os equipamentos mais sofisticados para essa atividade. Brasileiros, alemães, chineses ou esquimós fariam o mesmo, se tivessem os meios. Aliás, o próprio Snowden, promovido a inimigo público número zero dos EUA, dá detalhes a respeito. Não por acaso, são americanas as maiores empresas do mundo que criam tecnologia para o mundo inteiro usar.

Foi também nos EUA que surgiu o ditado “Não existe almoço grátis”, que o economista Milton Friedman, prêmio Nobel, reeditou em 1975 reeditou para dar título a um de seus livros. Se alguém acha que tudo de bom que a internet nos traz é de graça, também deve acreditar em Papai Noel e na cegonha. E, se é que alguém ainda se preocupa com isso, não custa reafirmar que nossa privacidade – de todos nós, que usamos computadores – já foi invadida e esmiuçada há anos, e continua sendo, toda vez que acessamos um site. Não há como recuperá-la.

1 thought on “Espiões por todos os lados

  1. Um dos primeiros textos SENSATOS sobre esse assunto… Tambem acho pateticas e puro teatrinho para a plebe essas reacoes “ofendidas” do g*verno brasileiro e outros sobre esse assunto de “espionagem”, inclusive como se ninguem soubesse do assunto… So mesmo se forem reacoes para ingles (o público) ver, pois sao inuteis.

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