Como tanta gente, não gostei de Sergio Moro ter aceitado o convite para ser ministro. Nem tanto por Bolsonaro, que mais uma vez mostrou ser esperto, mas pelo próprio Moro. Teria ele cansado de posar de “herói nacional”? Dizem que não estava aguentando mais a vida agitada(!!!) de Curitiba, onde não pode sair na rua nem ir ao cinema sem se ver cercado por oito, dez seguranças. Em Brasilia, estará melhor protegido. Ou estaria. Vai saber.

Não temo pela Lava Jato sem seu titular. Seria aceitar o argumento petista de que tudo só aconteceu porque Moro assim desejava. É não compreender o furacão que varreu o país nos últimos anos, nem a natureza do combate à corrupção não só no Brasil mas na maior parte dos países. Nenhum magistrado, por mais poderoso que seja, consegue controlar tamanha quantidade de dados e documentos se não tiver uma equipe de procuradores e assistentes igualmente engajados no processo. E os interesses são tão fortes, e difusos, que qualquer escorregão é facilmente detectado, arriscando colocar tudo a perder.

Após quatro anos, a Lava Jato é um sucesso inquestionável, admirado (e até copiado) no mundo inteiro. Continuará com outro juiz no comando, até porque a sociedade irá cobrar se assim não for feito.

“O que fará Moro se a PF

descobrir podres entre integrantes

das bancadas BBB?”

O que me preocupa em Moro no governo é que ele, como juiz, está acostumado a dar ordens, não a negociar, debater, ouvir opiniões contrárias, voltar atrás quando as circunstâncias o impõem, situações comuns a um ministro de Estado (pelo menos numa democracia). A transição de juiz para político envolve vários riscos, entre eles o de provocar decepção entre aqueles que esperam ver Moro “prender e acontecer” como ministro. Não vai acontecer, pelo simples fato de que ministro nenhum tem esse poder. Nem o presidente tem.

Sim, há o valor simbólico de ver um juiz – que a maioria considera isento – assumir um cargo que sempre foi reservado a políticos de carreira ou juristas mais preocupados com o Direito latu sensu. Um governo também se constrói com símbolos, mas no caso de Moro a montanha de problemas a sua frente é tão grande que, temo, isso será insuficiente.

Fico curioso para ver, por exemplo, o novo ministro negociando com o Congresso a aprovação de medidas anticorrupção; ou diante de jornalistas tendo que dar explicações, algo que sempre evitou enquanto juiz; ou, daqui a um ano, sendo convocado ao Senado para explicar por que a polícia brasileira é a que mais mata no mundo e, ainda assim, não consegue fazer cair a criminalidade. Se algum deputado gritar, Moro não vai poder mandá-lo calar a boca como já fez em audiências da Lava Jato.

Irá o novo ministro defender o porte de armas, como seu chefe? Gritará que os vermelhos devem ser exterminados? Pregará contra os gays? O que fará se a PF descobrir podres entre integrantes das bancadas BBB?

Alguém já disse que Paulo Guedes é ingênuo ao acreditar nos arroubos liberais de Bolsonaro, já que este se guia pelas regras nacionalistas militares. Receio que Moro possa se surpreender ao constatar que foi convidado para uma guerra em que, em vez de comandante, será apenas um soldado, e o único.

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