familiaPesquisando para uma edição especial sobre TV por Assinatura que estamos produzindo, encontrei uma série de ótimos artigos e estudos sobre as mudanças no comportamento dos usuários mundo afora. Como no Brasil os dados não são confiáveis, temos que analisar com as informações de que dispomos, mais uma boa dose de feeling, para tentar trazer esses estudos para nossa realidade.

Infelizmente, são poucos os especialistas brasileiros que se dispõem a compartilhar seus conhecimentos nessa área. A maioria dos que o fazem cai na armadilha de misturar os segmentos de televisão e de internet, o que a meu ver é um erro: por mais que estejam se aproximando, são dois mundos bem diferentes. A começar da atitude do usuário diante dos aparelhos: o ato de ver TV é mais gregário, coletivo, frequentemente compartilhado com amigos e familiares; navegar na internet é, quase sempre, uma ação individual, íntima, embora certamente mais interativa.

Claro, os dois mundos estão em transição, e talvez por isso não haja respostas claras para a maioria das dúvidas que o fenômeno nos traz. Nesse sentido, uma das melhores contribuições que encontrei foi um artigo de Samuel Possebon, competente editor do site Tela Viva, ao cobrir o Cable Congress 2014, que aconteceu na Holanda em março passado. Samuel relata uma palestra de Guy Bisson, diretor da consultoria IHS, especializada em estudos de mídia, que aponta alguns mitos recorrentes nas análises sobre as mudanças que estão acontecendo nos segmentos de TV e telecom em geral.

Tomo aqui a liberdade de reproduzir (os trechos entre aspas são os tais “mitos” que o consultor procura desfazer):

1) “Ninguém mais assiste à TV” – Segundo os dados de audiência coletados nos últimos anos na França, Alemanha, Espanha e Itália, a audiência da TV linear ainda está crescendo, com uma leve tendência de queda nos EUA e estabilização no Reino Unido.

2) “VoD está tomando o lugar da TV linear” – O número das pessoas que assistem TV linear ainda ganha disparado. 82% da audiência nos EUA é linear. Outros 9% assistem primordialmente o conteúdo gravado em DVR. E apenas 9% priorizam conteúdos online e sob demanda. Na Europa, os números são, respectivamente, 84% para TV linear, 11% para DVR e 5% para on-demand. Em 2017, a expectativa é que a audiência linear ainda corresponda a 76% da audiência, segundo a IHS.

3) “Os serviços OTT estão acabando com o mercado de TV paga” – Em termos econômicos, OTT é uma indústria de US$ 5 bilhões nos EUA, contra US$ 94 bilhões dos serviços de TV tradicionais. Essa proporção não muda nos próximos cinco anos.

4) “O set-top box está morrendo” – Os dados mostram que pelo menos até 2015 deve continuar a crescer o mercado de set-tops, sobretudo HDs e DVRs, com uma estabilização entre 2015 e 2017.

5) “Os  TVs conectados vão agregar todos os serviços” – Ainda não surgiu uma ferramenta de integração de todos os conteúdos em uma única interface, de modo que o “dono” do espectador ainda é o dispositivo que se conecta ao TV.

6) “O conteúdo é o rei” – Do ponto de vista econômico, segundo a consultoria IHS, as despesas com acesso foram de 250 bilhões de euros em 2008, mantiveram o patamar em 2012 e devem manter esse padrão até 2016. Já as despesas com dispositivos foram de quase 100 bilhões de euros em 2008, passaram de 100 bilhões em 2012 e devem manter o patamar em 2016. As despesas com conteúdo foram de cerca de 60 bilhões de euros em 2008, chegaram a 65 bilhões em 2012 e devem chegar a 75 bilhões de euros em 2016. Ou seja, a maior parte das despesas das pessoas continua sendo em acesso e em dispositivos, não em conteúdos.

7) “Os produtores de conteúdo irão direto para o consumidor, sem intermediários” – O problema para isso acontecer é compensar as perdas de receita das formas tradicionais de distribuição. Segundo a IHS, apenas no Reino Unido, para compensar a perda de receitas geradas pelos meios tradicionais aos preços praticados hoje nos modelos OTT, os produtores de conteúdo teriam que adicionar mais 5,6 milhões de clientes à base, sem perder nenhum.

8) “Apesar do crescimento do mercado OTT, os operadores tradicionais ainda vão ser os donos dos clientes” – É preciso considerar que os mesmos consumidores das operadoras de telecomunicações e TV paga tradicionais também são “consumidores” da Apple, Netflix e Google, por meio de produtos como o Android, iPhone etc., e as taxas de aquisição de novos clientes desses provedores é muito maior.

Deu pra perceber? O que alguns chamam de “novo telespectador” ainda deve demorar um pouco para ser reconhecido nas pesquisas.

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