A escassez de profissionais qualificados para TI

Por Jorge Castro*

Resolvi escrever esse insight após assistir a entrevista intitulada: “Por que profissionais qualificados não conseguem empregos?”, exibida no programa Espaço Aberto da Globo News. O programa contou com a participação de Paulo Resende, professor da Fundação Dom Cabral, e Leyla Nascimento, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-RJ). Apesar de não ter sido citado na entrevista, sem dúvida, o setor de Tecnologia da Informação está relacionado à abrangência da questão.

Enquanto preparava o material e buscava ideias para escrever, resolvi utilizar os vários profissionais do setor de TI, RH, gestores e dirigentes de empresas que fazem parte de nossa network, que atualmente ultrapassa 6 mil profissionais. Sinceramente, me surpreendi com a diversidade de opiniões. Obtive um ótimo resultado e agradeço a todos que participaram da enquete. Com isso, busco fomentar o assunto para – no mínimo – incentivar à reflexão. O tema em questão possui relevância, pois não se refere somente à falta de mão de obra e a profissionais buscando empregos, mas ao desenvolvimento nacional.

“Segundo o último ranking do Relatório Global de Tecnologia da Informação 2009-2010, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial, o Brasil ficou na colocação de número 61 em desenvolvimento nesta área, queda de três posições em relação à classificação divulgada ano passado. Estamos atrás de países como Uruguai, Panamá e Colômbia. É um retrocesso no crescimento do setor no país e isso se deve basicamente à falta de profissionais especializados para atender a demanda”.

André Assef, consultor em recrutamento de profissionais de TI.

Se existem demandas e fartura de mão-de-obra, onde estão as divergências? Será que estas discrepâncias evidenciam algum tipo de mediocridade existente no mercado? Segundo o dicionário Aurélio, mediocridade é aquilo que está entre o grande e o pequeno, o bom e o mau, ou aquilo que (ainda) não tem grande valor intelectual. Por isso precisa ser pensado e discutido com maior profundidade.

Ao analisar o aspecto da educação e formação de mão-de-obra, pode-se utilizar uma citação que vem sendo muito utilizada: “Nunca na história desse país se investiu tanto em educação”. Isso é uma realidade e vem tentando ampliar os índices de inclusão e ascensão social, mas o foco ainda não é a qualidade. Quando se fala em qualidade de educação, não se pode restringir o pensamento somente à generalização do termo; é necessário refletir sobre educação na amplitude e completude de sua essência.

Em busca de evidenciar mais os fatos, pode-se utilizar um trecho da matéria “Rascunhos do futuro“ que foi publicada no jornal O Globo Digital: “Numa escola da Zona Oeste do Rio de Janeiro, uma menina de 9 anos pergunta como se escreve astronauta e arranca gargalhadas dos colegas. A reação da turma a faz mudar de ideia ao colocar no caderno o que quer ser quando crescer: vendedora de roupas… a escola e a universidade dão o ensino, mas cada um tem uma coisa que é só sua: o sonho”.

Somente através de políticas públicas diligentes oriundas de um plano de desenvolvimento da nação, a educação permitirá que sonhos se tornem realidade, não somente para profissionais da área de informática, mas para toda a sociedade. Seria isso ir um pouco além de inclusão e ascensão social? A título de curiosidade, sugiro que se faça uma pesquisa no Google sobre o termo “AscenÇão social”. Vejam que interessante os sites que hospedam o termo.

Nicholas Carr, no artigo publicado em maio de 2003 pela Harvard BusinessReview e posteriormente em seu livro “IT Doesn’t Matter”, instiga a mudança na maneira de pensar sobre a aplicação da tecnologia da informação nas estratégias de negócios. Fundamentado em ricos exemplos históricos e contemporâneos, ele fornece conselhos práticos sobre como as empresas podem aproveitar a comoditização de TI.
Em 2007, escrevi alguns artigos a respeito da importância de TI e as possíveis alternativas para o processo de comoditização do setor. Entre eles, um artigo publicado aqui no Webinsider intitulado: O que a TI pode fazer pela marca de uma empresa, onde busquei apontar para o solução da inovação. Nesta mesma época, Luciano Coutinho presidente do BNDES, afirmou em entrevista que setores intensivos em mão-de-obra, que sofrem com a concorrência internacional em função da apreciação do câmbio, deveriam optar pelo “caminho inteligente”, ou seja, o da inovação para o desenvolvimento de produtos diferenciados que possam escapar da competição em custos e preços.

Obviamente, esse foi um recado abrangente, mas de forma alguma exclui o setor de Tecnologia da Informação das organizações. Para tanto, as atividades de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (P&D&I) vêm recebendo notável ênfase e concentrando grande parte dos esforços das empresas para a redefinição de suas posições estratégicas. As organizações começam a perceber que o grande diferencial para ampliação de seu arranjo competitivo e estratégico está ligado à sua capacidade de agregar o valor do conhecimento aos seus produtos, processos e serviços, através de mão de obra especializada.

Cabe às empresas brasileiras, através da utilização de todo o potencial que a TI oferece, assimilar e desenvolver continuamente novas tecnologias e produtos, visando à redução de custos, manutenção e ampliação do mercado, com vista a competir em preço e qualidade em condições de igualdade, tanto com países de elevado nível de desenvolvimento tecnológico, quanto de países onde os custos de novas tecnologias e produtos estão num patamar bem mais baixo, principalmente devido ao menor valor de mão de obra.

O termo da língua inglesa commodity se refere a qualquer tipo de mercadoria primária não manufaturada, ou parcialmente manufaturada, como produtos agropecuários e recursos naturais, passível de ser negociada em Bolsas de Mercadorias. Torna-se oportuno ressaltar que aqui no Brasil, geralmente utiliza-se bóias frias – mão de obra sem necessidade de qualificação e de baixo custo – para trabalhar com mercadorias caracterizadas como commodities, objetivando reduzir custos e obter maior competitividade no mercado. Seria esse um “caminho inteligente” para a utilização dos recursos de TI?

A pesquisa divulgada no V Encontro Empresarial promovido pela Assespro, executora do Bureau de Inteligência do Arranjo Produtivo Local (APL) de Software do Governo do Estado de Minas Gerais, constata que: “… a área de informática é sempre vista como promissora e, apesar de quem trabalha nela tender a ter uma boa condição financeira, a realidade não é bem esta… o levantamento apontou que cerca de 48% dos profissionais possuem uma renda familiar de até R$ 1.875,00 mensais, insuficiente para investir em formação…”.
Leyla Nascimento, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos, relata na entrevista citada acima, que ainda há um caminho a ser trilhado na qualificação dos profissionais de RH, principalmente àqueles que cuidam de recrutamento e seleção. Isso se tornou evidente nas respostas da enquete realizada com a nossa network. Recebi inúmeros relatos de profissionais seniores, mestres e até mesmo doutores, que participaram de processos seletivos conduzidos por profissionais evidentemente neófitos. Orientados a se preocuparem com algumas certificações específicas e principalmente com aspectos que diziam respeito a baixos valores salariais e benefícios.

Tantos outros colegas de ofício dizem estar extremamente insatisfeitos e frustrados com seus trabalhos, desmotivados com a falta de oportunidades de melhorias, desafios inovadores e realizações profissionais. Apesar de todo o discurso das reais necessidades de inovações nas organizações. O fato é que estamos perdendo excelentes e experientes profissionais para o exterior, mesmo com o mercado mundial ainda passando pela crise. A boa notícia é que algumas empresas já estão atentas para essa situação, recrutando e buscando motivar adequadamente seus valiosos recursos.

*Publicado no site Webinsider em 04/07/2010.