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A piada do direito autoral

Se alguém quiser copiar e publicar algum texto deste blog, só poderá fazê-lo 70 anos depois que o autor destas mal traçadas for embora deste mundo. Não é uma boa piada? Pois está na atual Lei dos Direitos Autorais, escrita em 1966, revista em 1973 e novamente alterada em 1998. Agora, depois que uma CPI descobriu o que todo mundo sabia – que há farta corrupção no órgão oficial do setor, o ECAD – o tema voltou a ser discutido, em meio a forte pressão de alguns artistas. Uma trapalhada do governo federal (mais uma) impede, porém, que uma nova lei seja escrita e enviada ao Congresso. Permanece engavetado um anteprojeto elaborado em 2010 pelo Ministério da Cultura, comprovando que o assunto não é prioridade.

No Congresso, circula um outro projeto que, se pelo menos fosse debatido, ajudaria muito o país (vejam aqui um resumo). Basicamente, está se falando de adaptar a vida cultural brasileira à realidade do mundo digital e multimídia. Claro, é um assunto polêmico. Por isso mesmo, mereceria um debate amplo e aberto, por todos os meios disponíveis. O texto que está no Congresso libera, por exemplo, as cópias de produtos culturais para fins educativos, ou seja, bibliotecas, museus e órgãos do gênero poderiam utilizar cópias de livros, filmes etc., e fazê-las circular até mesmo por meios eletrônicos, nos limites de suas respectivas redes. Mais: ficaria autorizada a cópia informal, aquela que uma pessoa faz para uso próprio ou para compartilhar com amigos, sem fins comerciais.

Até aí, acredito que haja consenso. Os problemas começam quando se amplia o leque dessa liberalização. Um dos trechos do projeto prevê que não seria mais crime “a venda ou locação de obras intelectuais para fins informativos, de pesquisa ou para uso como recursos criativos”. Um livro ou artigo, portanto, poderia ser vendido, mesmo sem autorização de seu autor, e o vendedor alegaria que a obra lhe serve de “inspiração criativa”, ou algo do gênero. Outra piada, não? O site Convergência Digital abordou o assunto esta semana.

Sou daqueles que defendem a proteção dos direitos do autor em todas as situações – não precisa ser 70 anos após sua morte, talvez uns 10 ou 15! Mas soa meio ridículo dizer isso num país que nunca respeitou nem os direitos de grandes artistas e escritores de obras impressas, e que, portanto, dificilmente o fará no domínio digital. Há autores liberais nesse ponto – como Gilberto Gil e Paulo Coelho -, mas são exceção, não regra. A maioria das pessoas que defendem o “liberou geral” nada produz de criativo, nem faz a menor ideia de quanto custa escrever um livro, compor uma música, produzir um filme ou criar um software.

Faturam com o suor e o talento dos outros.

Orlando Barrozo

Orlando Barrozo é jornalista especializado em tecnologia desde 1982. Foi editor de publicações como VIDEO NEWS e AUDIO NEWS, além de colunista do JORNAL DA TARDE (SP). Fundou as revistas VER VIDEO, SPOT, AUDITÓRIO&CIA, BUSINESS TECH e AUDIO PLUS. Atualmente, dirige a revista HOME THEATER, fundada por ele em 1996, e os sites hometheater.com.br e businesstech.net.br. Gosta também de dar seus palpites em assuntos como política, economia, esportes e artes em geral.

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