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Cheiro de bolha no ar

O mundo da tecnologia – e particularmente o da internet – é engraçado, às vezes. Vale mais o oba-oba do que a realidade. E parece que as pessoas gostam disso. Nada é profundo, tudo é deixado, propositalmente, na supefície. Me faz lembrar um antigo professor de física que, diante da nossa dificuldade colegial em decifrar certas questões da ciência, acusava seus alunos de “preguiça mental”.

Pensem bem: quantas e quantas empresas já vimos surgir e desaparecer desde que o mundo entrou em conexão permanente? Quantas marcas já foram criadas, algumas até com belos logotipos, ganharam status nas redes sociais, foram replicadas e tuitadas, até sumirem dos mapas digitais? Quantos produtos ou serviços – hoje é comum dizer “plataformas” ou “apps”- tiveram lançamento badalado e duraram somente alguns meses no mercado? Quantos “empreendedores” foram chamados de gênios, ou garotos-prodígio, para logo serem esquecidos? Para cada Zuckerberg que a mídia enaltece, devem existir milhares, talvez milhões, de fracassados. Ou não?

Bem, mas por que estou lembrando tudo isso? É que a triste memória da bolha da internet, ocorrida na virada do século 21, voltou às discussões nas últimas semanas. Marcas que surgiram na esteira da popularização das redes sociais estão sendo detonadas, em muitos casos pelas mesmas pessoas (os “especialistas”) que as adulavam anos atrás. Ontem, por exemplo, ganhou destaque em sites internacionais a notícia de que a Zynga, empresa dedicada à criação de jogos online, está à beira da falência. Mark Pincus, seu criador, que chegou a ser apontado como “novo Zuckerberg”, teria chegado às lágrimas ao procurar a Apple em busca de ajuda. No ano passado, ao fazer o lançamento público de suas ações na Nasdaq, a Zynga foi avaliada em US$ 9 bilhões. De lá para cá, seu valor de mercado caiu para US$ 2 bilhões, e a cotação de suas ações despencou nada menos do que 75%. Ou seja, quem investiu naquele IPO ficou 75% mais pobre. O caso é contado em detalhes aqui.

Na mesma toada parece caminhar a Groupon, primeiro site de compras coletivas, que surgiu nos EUA em 2008, ganhou as manchetes e depois se espalhou pelo mundo, inclusive no Brasil, além de inspirar uma série de concorrentes. Seu sucesso inicial se baseava numa promessa fácil: comprando em grupo, obtém-se melhores preços e todo mundo sai ganhando. O site funciona como agregador de ofertas e de possíveis compradores, recebe um percentual do que cada um paga, mas não se responsabiliza por eventuais problemas na finalização de cada negócio. E problemas não faltam nesse tipo de relação: atrasos na entrega dos produtos adquiridos, falhas na cobrança, itens defeituosos e um longo etc. Basta dar uma olhada na situação da Groupon Brasil junto ao Procon, que já comentamos aqui.

Como os problemas são os mesmos no mundo inteiro, a credibilidade da empresa – e do próprio conceito de compras coletivas online – está na sarjeta. Suas ações na Nasdaq também não param de cair, depois de ser cogitada até sua incorporação pela Google Inc., pela pechincha de US$ 5,3 bilhões, no final de 2010. Larry Page e Sergey Brin, donos da Google, devem estar aliviados por Andrew Mason, fundador da Groupon, ter recusado a oferta.

O próprio Facebook teve um 2012 difícil do ponto de vista financeiro (detalhes, neste link). Parece mais uma das empresas que são muito badaladas e pouco compradas, ou seja, não conseguem gerar retorno para seus investidores. Quando estava pesquisando para meu livro Os Visionários – Homens que Mudaram o Mundo através da Tecnologia, cansei de encontrar depoimentos de ‘experts’ anunciando que a consolidação da empresa fundada por Mark Zuckerberg era apenas questão de tempo; na época, o Facebook dizia possuir mais de 700 milhões de usuários (se fosse um país, seria o terceiro mais populoso do planeta), caminhando para superar a marca de 1 bilhão, que teria sido atingida em outubro último. Em maio, após abrir seu capital na Nasdaq, a empresa chegou a ser avaliada em US$ 75 bilhões; no IPO, captou US$ 16 bilhões.

Hoje, analistas de Wall Street se perguntam quantos investidores estão no prejuízo por sua causa.

Orlando Barrozo

Orlando Barrozo é jornalista especializado em tecnologia desde 1982. Foi editor de publicações como VIDEO NEWS e AUDIO NEWS, além de colunista do JORNAL DA TARDE (SP). Fundou as revistas VER VIDEO, SPOT, AUDITÓRIO&CIA, BUSINESS TECH e AUDIO PLUS. Atualmente, dirige a revista HOME THEATER, fundada por ele em 1996, e os sites hometheater.com.br e businesstech.net.br. Gosta também de dar seus palpites em assuntos como política, economia, esportes e artes em geral.

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