Quem está numa posição de comando raramente assume a responsabilidade pelos erros de sua equipe. Isso vale para todas as áreas onde o bicho homem atua. De cara, me vem à lembrança a figura do técnico de futebol: é muito mais fácil culpar o juiz, ou a falta de sorte, do que assumir que errou na escalação de seu time.

Filósofos e antropólogos já explicaram as dificuldades do ser humano em assumir suas culpas – e sua árdua luta para escondê-las. Se isso é grave nos relacionamentos cotidianos, torna-se gravíssimo quando praticado por políticos e poderosos em geral. Na cabeça da maioria deles, é justamente para isso (transferir suas culpas…) que serve a imprensa. É possível contar nos dedos de uma mão, e olhe lá, aqueles que atravessaram seus mandatos sem se queixar da mídia, chutando para longe a obviedade de que esta existe justamente para questionar quem está no poder.

É atribuída a Enoch Powell, político e escritor inglês do século passado, a frase perfeita para o momento: “Um político reclamando da mídia é como um marinheiro reclamando do mar”. Na boca de políticos como Lula, Bolsonaro, Chavez ou Trump, as acusações à imprensa soam ainda mais grotescas. São figuras que se acham acima do bem e do mal, por isso vivem cercados de claques, físicas ou virtuais. Adoram seus puxa-sacos.

Sim, é verdade que jornalistas também não gostam de ser criticados; conheço alguns que detestam. Seu maior inimigo é o desprezo. A melhor forma de combatê-los é ignorá-los. E, claro, nos tempos que correm, não compartilhar o que dizem ou escrevem. O mesmo vale para os veículos que os empregam. Não gosta? Deixe de comentar sobre eles, procure os concorrentes. 

Hoje, o leitor que quiser (mesmo) se informar – sobre qualquer assunto – encontra uma ampla variedade de fontes ao alcance de um clique. Se pretende confrontar opiniões, a maior parte dos comentaristas lhes oferece blogs, tuítes, posts, vídeos, podcasts etc. O problema é que esse ato elementar da cidadania – examinar pontos de vista divergentes e a partir daí formar sua opinião – só se consuma quando há capacidade de discernimento e honestidade intelectual. Dois artigos escassos no Brasil de hoje.

Os recentes casos envolvendo as jornalistas Patricia Campos Melo (da Folha de São Paulo) e Vera Magalhães (Estadão e TV Cultura-SP) servem para que ninguém se esqueça: todos os políticos são iguais quando se trata de combater a imprensa. O que muda é o estilo. Bolsonaro copia Trump, que já copiava Chavez (este apoiado sempre por Lula): acusar primeiro – daí surgiu o termo fake news – e deixar que sua legião de bajuladores faça o resto do serviço. Que costuma incluir ofensas de todo tipo e até ameaças físicas. Alguns ainda juram que fazem isso “em nome de Deus”.

É famosa a regra de Thomas Jefferson, cofundador da democracia americana: “Melhor uma imprensa livre sem governo do que um governo sem imprensa livre”. Lamentavelmente, há quem prefira o inverso: um governo autoritário, ainda que incompetente e corrupto, a uma imprensa atenta e vigilante. Foi assim na Alemanha e na Itália de quase 100 anos atrás, e em vários países latino-americanos nas últimas décadas. Muitos brasileiros parece que não aprenderam. Ou talvez gostem mesmo de governos corruptos e incompetentes.

A propósito, me lembrei de um post publicado aqui em 2013 sobre a importância de se ter uma imprensa profissional, atuante e livre de ameaças. Era sobre o fechamento de um jornal. Este é o link para quem quiser refletir a respeito.

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