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Meio século sem Satchmo

 

 

 

 

 

 

A foto ao lado reproduz uma página inteira do jornal novaiorquino Daily News de 6 de julho de 1971. Naquele dia, não havia assunto mais importante do que a morte – enquanto dormia, em sua casa no bairro Queens – de Louis Armstrong.

E a manchete “Fim de uma era” estava longe de ser exagerada. Afinal, partia o homem que ensinou um país inteiro (na verdade, um planeta inteiro) a apreciar a arte da música, cantada e tocada frequentemente de puro improviso. Um artista que, em cinco décadas, ajudou a dignificar a música universal mesmo sem ter educação formal. E que mostrou a todos que vieram depois como cantar e tocar uma música que vinha do fundo da alma. E, talvez acima de tudo, levou plateias brancas a reverenciar um negro como o primeiro grande artista planetário (o que não era pouco, numa sociedade tão dividida pelo racismo).

Louis Daniel Armstrong (1901-1971), Satchmo para os íntimos, fez tudo isso e muito mais. Livros e mais livros já foram escritos sobre sua trajetória, da infância pobre em New Orleans, a cidade-berço do jazz, onde foi parar num reformatório, espécie de “Febem” da época, até se tornar – antes dos 30 anos – o músico popular mais famoso do mundo. De junho de 1918, quando assumiu como solista da Kid Ory Creole Jazz Band, até sua morte, Louis foi sempre a referência para todo cantor, instrumentista, showman ou band-leader que levasse a carreira a sério.

Sim, vários pesquisadores defendem que Louis – com aquela voz rouca e aparentemente sem alcance – “ensinou a América a cantar”, com graça, charme, sentimento, fraseado único e uma divisão rítmica nunca vista antes. Outros lembram que o Satchmo trompetista foi quem quebrou a estrutura do jazz vigente nos anos 1920, em que cada solista tinha seus segundos contadinhos no arranjo. Seus improvisos não vinham do nada; eram criados dentro das harmonias originais das canções, mesmo quando essas eram hinos como Stardust, Once in a While ou St Louis Blues.

Na verdade, há muito de mitológico na figura de Armstrong (como nas de todo grande artista). Embora tenha levado aos limites a arte de improvisar, não tocava simplesmente “de ouvido”. Aprendeu a ler música no reformatório e sabia discutir partituras e arranjos com gente como Duke Ellington. O que só engrandece suas façanhas.

Analisando o que veio depois, pode-se tranquilamente afirmar que Louis Armstrong abriu uma larga estrada pela qual desfilaram todos os músicos do século 20. Em 1929, já era o músico mais conhecido do planeta e, comandando seus Hot Five, depois os Hot Seven, tornou-se nos anos 30 o primeiro jazzista a excursionar para fora dos EUA; só esteve no Brasil em 1957; na foto ao lado, aparece abraçado ao nosso Pixinguinha. Com o tempo, co-inventou o scat, estilo de cantar improvisando sobre a melodia e a letra originais, e o mundo descobriu nele um excepcional entertainer, capaz de fazer todo mundo rir – como neste dueto com Frank Sinatra.

A casa onde Louis viveu a partir de 1943 com sua quarta esposa, Lucille, no Queens, abriga hoje o Museu Louis Armstrong e é também a principal referência para quem deseja conhecê-lo melhor. É uma visita emocionante. Aqui, um tour virtual.

Orlando Barrozo

Orlando Barrozo é jornalista especializado em tecnologia desde 1982. Foi editor de publicações como VIDEO NEWS e AUDIO NEWS, além de colunista do JORNAL DA TARDE (SP). Fundou as revistas VER VIDEO, SPOT, AUDITÓRIO&CIA, BUSINESS TECH e AUDIO PLUS. Atualmente, dirige a revista HOME THEATER, fundada por ele em 1996, e os sites hometheater.com.br e businesstech.net.br. Gosta também de dar seus palpites em assuntos como política, economia, esportes e artes em geral.

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