Ciência e tecnologia têm sido fundamentais para resolver boa parte dos problemas que a humanidade enfrenta. O mais recente exemplo é a COVID-19. Sem os avanços tecnológicos e a dedicação de milhares de cientistas e profissionais de saúde, o número de vítimas seria infinitamente maior (como parece que alguns políticos desejavam) e ainda não teríamos tanta gente vacinada – aliás, a rapidez com que as vacinas foram descobertas não tem paralelo na História.

Mas a tecnologia também ajuda a atrapalhar a vida de muita gente. Refiro-me à profusão de aplicativos que surgem a todo momento, muitos dos quais funcionam como mero instrumento de marketing, quando não são verdadeiras armadilhas para o consumidor. Especialistas dizem que o Brasil tem uma das melhores legislações de defesa do consumidor no mundo, e no entanto as maneiras que muitas empresas encontram para burlar a lei espantam pela criatividade e ousadia.

Entre as primeiras nos índices de maus tratos aos clientes destacam-se os bancos. Nos últimos dois anos, comecei a catalogar episódios de desrespeito e descaso relatados por amigos e parentes em relação a cartões de crédito, cheques especiais, taxas cobradas indevidamente etc.

Pior: todos os bancos, sem exceção, gastam milhões divulgando seus serviços online, incluindo apps para celular, como se ali estivesse a solução para tudo. É quase como rir na cara do cliente. Não à toa, muita gente está migrando para os bancos digitais, onde tudo é mais prático e mais barato.

Falhas como as relatadas acima deixam claro que um app, por melhor que seja, possui limitações intrínsecas; trata-se de um software escrito para agilizar operações simples, e jamais pode – como dão a entender os bancos – substituir a gama de serviços de uma agência bancária, muito menos a orientação prestada por um funcionário bem treinado.

Agora, o fenômeno vem se espalhando por outros segmentos. Começo a coletar queixas similares relacionadas às operadoras de telecom, empresas que, por definição, deveriam ser campeãs no atendimento online. Quem dera!

Desde 2014 está em vigor a norma da Anatel que visa facilitar a tarefa de quem deseja cancelar seu plano de telefone, banda larga ou TV por assinatura. No início, acompanhamos a (lentíssima…) adaptação das operadoras até concluir que, pelo menos as principais, estavam atuando bem. Decorridos sete anos, o que se vê é um total desrespeito à regra que estabelece, entre outras coisas, que o site da operadora deve oferecer os caminhos, claros e rápidos, para o cliente cancelar o serviço a qualquer tempo.

Num contato recente com uma delas, por telefone, em vez de alguém falando aparecia uma tela cheia de opções; lá embaixo, quase escondida, a linha “desistência de cancelamento”. Para que serviria?Para o cliente cancelar o serviço, ou para “desistir de cancelar”?

Curioso pela resposta, cliquei. E me surgiu a mensagem de que a receberia por email. De fato, minutos depois chegou: ligar para a central de atendimento telefônico. Ou seja, do telefone para o app, e deste de volta ao telefone. Repetida a tentativa pelo site, o círculo vicioso foi o mesmo.

É de se perguntar: por que tanto investimento em atendimento online se é para fazer o cliente dançar (literalmente) entre uma mídia e outra? E o que a Anatel pode dizer a respeito?

1 thought on “Aplicativos fazem clientes de vítimas

  1. Olá, Orlando! Ótimo assunto sobre o qual você abordou! Há umas duas semanas, a Claro Móvel emitiu um boleto em meu CPF a título de um tal “Plano Controle” (que eu não solicitei) que converteria um de meus números pré-pagos (um que nem utilizo) para pós-pago e com mensalidade de R$ 59,99 (!). Indignado, tentei o aplicativo, depois o website da operadora e não consegui encontrar qualquer canal onde eu pudesse protestar e cancelar o tal estelionato! O atendimento oferecido é somente por robôs e nem um endereço de e-mail sequer! Apelei para o Consumidor.gov.br , abrindo uma reclamação e somente assim pude esculhambar essa operadora e obter o cancelamento. Até desafiei a Claro a comprovar o suposto registro onde eu teria feito tal solicitação de plano, mas, obviamente, não foi apresentado qualquer registro. Ah! Lembrando que também não encontrei o tal canal para cancelamentos, que é obrigatório! Depois de tudo isso, encontrei em minha agenda o antigo número 1052 que costumávamos usar para ligar de telefones fixos para a Claro; está ativo, mas esse número não consta mais nem do aplicativo e nem do website. É afrontoso!

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