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Como fabricar displays?

Existem no mundo poucas fábricas de displays. A maior parte delas está na China; as demais, em Taiwan, Coreia do Sul e Japão. Nenhum outro país até agora conseguiu se equipar para esse que é um dos maiores desafios da indústria eletrônica. Os que mais consomem e que teriam condições técnicas para isso – caso de Estados Unidos e Alemanha, por exemplo – simplesmente não o fazem porque é mais barato comprar pronto. Já estive em algumas dessas fábricas. Além de infraestrutura sofisticada e mão-de-obra qualificadíssima, elas exigem um grau de eficiência e confiabilidade que acaba limitando o desafio a muito poucas empresas (mais detalhes a respeito neste link).

E, no entanto, o governo brasileiro insiste em ter aqui uma fábrica de displays, como se essa fosse uma grande prioridade nacional. Um dos motivos que afastaram a Foxconn do projeto de montar tablets e smartphones aqui foi justamente essa obsessão, que não tem qualquer base na realidade. Como contrapartida para atender à enorme lista de exigências do grupo taiwanês, o Brasil impôs a condição de que 50% das telas dos aparelhos fossem fabricadas aqui até 2014. A alternativa que as autoridades brasileiras sugeriram foi – acreditem – a montagem de uma fábrica de displays LCD!!! Foi quando os chineses pularam fora, talvez percebendo que não estavam negociando com gente séria.

“A Foxconn está fazendo demandas malucas”, disse à agênca de notícias Reuters um integrante do governo. O autor do comentário provavelmente não faz a menor ideia do que é uma linha de produção de eletrônicos. Sim, a Foxconn estava querendo benefícios que, se fossem concedidos, caracterizariam um privilégio e, portanto, concorrência desleal com os demais fabricantes. Mas esse não é o ponto. Um país pode, se quiser, fazer concessões especiais para empresas ou setores estratégicos – o que são, por exemplo, as isenções fiscais à Fifa para a realização da Copa do Mundo?

O problema se configura quando o governo define como “estratégicos” projetos ou setores que até países mais avançados deixaram de lado, por serem inviáveis. Vejam esta declaração do ministro Mercadante ao portal G1: “Uma das principais metas do Ministério agora é atrair empresas para produzir telas sensíveis ao toque no Brasil, o que representaria um marco para o país”. Agora esta, extraída do blog de Luis Nassif, citando fontes do BNDES: “Uma indústria de displays no país criaria ambiente para formar recursos humanos e atrair fábricas de suporte à indústria de semicondutores”.

Ou seja, basta montar uma fábrica que, num passe de mágica, formaríamos milhares de trabalhadores qualificados e outras empresas viriam correndo para fornecer os componentes necessários. Não seria o oposto? Que tal investir em boas escolas e em infraestrutura, para depois pensar em erguer fábricas? E, num país tão carente de saúde, educação e segurança, não seria mais justo dar prioridade a estes investimentos? E, por último, com o já conhecido custo Brasil, quais as chances de um display feito aqui custar menos do que os importados?

A quem essa gente pensa que engana?

 

Orlando Barrozo

Orlando Barrozo é jornalista especializado em tecnologia desde 1982. Foi editor de publicações como VIDEO NEWS e AUDIO NEWS, além de colunista do JORNAL DA TARDE (SP). Fundou as revistas VER VIDEO, SPOT, AUDITÓRIO&CIA, BUSINESS TECH e AUDIO PLUS. Atualmente, dirige a revista HOME THEATER, fundada por ele em 1996, e os sites hometheater.com.br e businesstech.net.br. Gosta também de dar seus palpites em assuntos como política, economia, esportes e artes em geral.

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  • Orlando, este pessoal do governo, principalment este ministro Mercadante, não tem a menos idéia do que está falando. Infelizmente é costume, neste país, designarem pessoas totalmente desqualificadas para o alto escalão. O que importa são as razões políticas e as do partidão. Enquanto isto, vamos ficando no atraso e nos afastando totalmente das nações mais desenvolvidas. Enquanto algum governo futuro, em uma época também futura, não resolver o problema do sistema tributário brasileiro caótico e irracional, nada se faz neste país de útil! Aqui o governo está acostumado a resolver seus problemas com recursos de terceiros, primeiro o governo quer levar o seu e as migalhas ficam com os empresários e isto não funciona assim, o empresário só trabalha se existe possibilidade de lucro e sucesso!

  • Isso mesmo, os interesses políticos futuros podem acarretar atos irresponsáveis no presente. O brasil é um país que sofre terrivelmente na questão setorial que é a Educação.
    Como um país que tem como uma instituição denominada MEC, que tenta impor a todo custo um projeto de abolir as regras da lingua e ensinar a contar errado, tem a petulância de impor uma industria de altissima tecnologia como o de hardware?

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Orlando Barrozo

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