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O golpe do Ginga

Pode-se aguardar para as próximas semanas a ação judicial dos fabricantes de televisores contra a portaria que obriga a introdução do DTVi (Ginga) nos aparelhos a partir de 2013. Essa é uma novela que não deve terminar tão cedo. O governo cansou de ouvir as queixas dos fabricantes e decidiu dar uma sonora rasteira em todos eles: publicou a portaria no Diário Oficial, na última quinta-feira, e agora não há mais negociação. A decisão foi dos ministros do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, e de Ciência e Tecnologia, Marco Antonio Raupp – este, na verdade, acabou de assumir o cargo, no lugar que era de Aloizio Mercadante, e mal sabe o que está acontecendo; na verdade, Mercadante era um importante interlocutor da indústria eletrônica, que agora se vê ainda mais distanciada do governo federal.

A questão tem seu lado técnico, mas também fortes implicações políticas. Tecnicamente, o governo exige que todo o parque instalado de televisores seja, até a Copa do Mundo, compatível com interatividade. Parte dos ministros e seus assessores técnicos acha que isso irá gerar empregos, atendendo a uma antiga (desde 2007) reivindicação da indústria de software. Equipados com o Ginga, os TVs podem receber, por exemplo, aplicativos de interesse do governo, que pensa com isso modernizar os serviços públicos até 2014. Com um TV desses, o usuário poderia acessar em casa informações de setores como saúde, previdência etc.

Parece bonito, mas – como tudo que vem do governo – é bom desconfiar. Primeira ressalva: o preço dos TVs deve aumentar. Segunda: vários fabricantes já lançaram TVs com interatividade, e o consumidor simplesmente ignora esse recurso; a maioria, por sinal, nem tem interesse nele, como de resto acontece no mundo inteiro. Interatividade é coisa de computador, e o governo faria muito melhor se ampliasse seus serviços pela web. Um terceiro ponto de questionamento é que a portaria faz distinção entre TVs comuns e TVs conectados (os chamados Smart TVs). Para os primeiros, estipula que 75% dos itens produzidos no Brasil deverão ter o Ginga em 2013; para os conectados, o percentual é de 100%. Mais: os fabricantes devem “abrir” os códigos IP dos TVs para os desenvolvedores indicados pelo governo.

Aí é que o problema passa a ser, também, político. Embora a indústria não tenha chegado ainda a um consenso, é praticamente certo que os principais fabricantes não vão aceitar abrir seus códigos, pois é isso o que os diferencia da concorrência. Do ponto de vista mercadológico, essa exigência não faz o menor sentido. Seria como pedir a um técnico de futebol que antecipe sua estratégia antes do jogo começar. No mínimo, dá uma boa briga na Justiça.

O maior problema, a meu ver, é que o governo tomou essa decisão sem nem se dar ao trabalho de saber quais conteúdos interativos será possível ao consumidor acessar. O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, disse ao site Convergência Digital que irá chamar as emissoras para conversar a respeito, o que é mero jogo de cena. Nenhuma das grandes redes tem interesse em oferecer interatividade em sua programação, pelo bom motivo de que ela atrapalha, e não ajuda, o telespectador. Todas as pesquisas já feitas mostram que o usuário, quando está assistindo a sua novela ou a seu jogo de futebol, não quer ser interrompido. É consenso no meio publicitário que ninguém irá investir nesse tipo de mídia; e, sem publicidade, nenhuma emissora irá manter esse conteúdo no ar.

Impressionante como, na área de tecnologia, este governo cria problemas onde eles não existem. Dá até a impressão de que esses ministros não têm coisas importantes com que se preocupar!!!

Orlando Barrozo

Orlando Barrozo é jornalista especializado em tecnologia desde 1982. Foi editor de publicações como VIDEO NEWS e AUDIO NEWS, além de colunista do JORNAL DA TARDE (SP). Fundou as revistas VER VIDEO, SPOT, AUDITÓRIO&CIA, BUSINESS TECH e AUDIO PLUS. Atualmente, dirige a revista HOME THEATER, fundada por ele em 1996, e os sites hometheater.com.br e businesstech.net.br. Gosta também de dar seus palpites em assuntos como política, economia, esportes e artes em geral.

View Comments

  • Olá pessoal.
    Maioria das TVs em 2012 vão ter capacidade para 3D.
    Pergunta.
    Quem compra essas TVs assiste programas de TV em 3D?
    Lembrando que 3D é adotada por uma unica emissora de TV no Brasil e é uma ainda em desenvolvimento e cara.
    Os custos são altos para ter esta capacidade num equipamento de TV e ninguém reclama.
    Carlos

    • Olá Carlos, alguns TVs têm capacidade de converter o sinal de 2D (convencional) para 3D. Não todos. E a qualidade varia de um para outro, pois depende da qualidade do conversor. Abs. Orlando

  • Prezado Orlando,

    Blogs são utilizados para dar opiniões pessoais, e respeito a sua.

    Porém talvez você devesse citar fontes e pesquisas para que sua opinião tenha fundamento. O que eu vejo na pratica é bem diferente do que você afirma.

    Aplicativos interativos crescem em quantidade e qualidade todos os dias. Basta você se desplugar de sua tv por assinatura e acompanhar a TV Digital. Outro ponto, aumentar custos? Faça uma pesquisa e veja se televisores DTVi sao mais caros que os os que sao somente DTV.

    É claro que como editor de revista você se preocupa com seu negocio e lamentavelmente escreve os que seus anunciantes (fabricantes) querem que seja a visão da ação do governo.

    Espero que você, no papel de jornalista, traga fatos e detalhamento de informações que sejam úteis aos seus leitores. Fica aqui o toque de quem compra sua revista.

    • Olá Paulo, obrigado pela msg. Como você pode reparar, sempre citamos aqui as fontes das informações. Mas, como em qualquer site, jornal ou revista, isso nem sempre é possível; muitas fontes pedem anonimato, e isso tem que ser respeitado. Gostaria que você me apontasse onde estão esses aplicativos que "crescem em quantidade e qualidade todos os dias". Agora, você está enganado: nada do que é publicado aqui tem influência de anunciantes. Simplesmente, reflete o que penso a respeito dos assuntos. Lamento isso não esteja sendo útil para você. Abs. Orlando.

  • Oi Orlando,

    obrigado por responder ao meu questionamento. Realmente espero estar enganado, muito embora a ausência de fontes e pesquisas sérias faz a sua opinião ser muito IGUAL a da Eletros* (Entidade que defende os interesses dos fabricantes de televisores e afins)

    TVGlobo, Record, SBT possuem uma quantidade bem razoável de aplicativos. Recomendo que faças uma pesquisa sobre o tema. Tem canal com aplicativo o dia inteiro, SBT por exemplo.

    * aprendi com os "foristas" do HTForum o que é Eletros, e como eles estão inventando coisas a respeito do padrão DTVi e que traz novos recursos gratuitos para o consumidor. Preço de televisor mais caro, por exemplo, é uma falácia. Você como jornalista podia investigar isso e esclarecer seus leitores. É fácil: http://www.bondfaro.com.br. Só que bater de frente com a Eletros é bater de frente com anunciantes. Respeito se não fizer. Abs, Paulo.

    • Paulo, se vc pesquisar aqui mesmo neste blog vai encontrar várias críticas que fizemos à Eletros e a fabricantes. Não é esse o problema. As pessoas têm mania de querer enxergar segundas intenções em tudo. Então, ninguém pode dar uma opinião que já ficam especulando "o que será que está por trás disso?" É mais fácil do que pensar e refletir sobre os problemas. A interatividade do SBT é primária. Já vi algumas coisas interessantes da Globo, e só. Sei que há desenvolvedores tentando trabalhar nessa área, mas se as emissoras não tomarem a iniciativa, de pouco adianta ter esse recurso nos TVs. E elas mesmas admitem, em off, que não vêem como ganhar dinheiro com isso. Tanto que nem divulgam... Repito: o governo escolheu o alvo errado (os fabricantes), pois é mais fácil brigar com eles do que com as emissoras. Se vai aumentar o preço ou não, é mero detalhe. Aliás, em quase tudo que se relaciona à tecnologia, preço geralmente é o menos importante. Abs. Orlando

  • O fato é, para funcionar precisa de conexão, pois nunca vai existir canal de retorno. Quem tem conexão não vai querer trocar o teclado pelo controle da tv.

    Quer interatividade, atualiza esse monte de site ridículo do governo. Abre licitação sem ser direcionada para empresas A,B ou C.

    Criem canais para smartphones.
    #ficadica

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Orlando Barrozo

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