No momento em que escrevo, não sei se a greve dos Correios já terminou – está acontecendo agora uma reunião entre os grevistas e a direção da empresa. Mesmo que termine, no entanto, temos aí mais uma lição de como colocar interesses privados (no caso, de um grupo) acima dos interesses públicos (que são os da população em geral).

Não sei o que pensam os leitores (e gostaria de ouvi-los a respeito), mas sou de um tempo em que o Brasil aprendeu a fazer greve. Sob a liderança original e sincera de um sujeito chamado Lula, os metalúrgicos do ABC – e depois deles representantes de várias categorias de trabalhadores – criaram um movimento social digno de dar exemplo às melhores democracias do mundo. Isso foi há 30 anos, um processo que, por dever de profissão, acompanhei de perto. Não foram poucas as assembléias que cobri como jornalista, e posso dizer que foi um privilégio testemunhar esse período da História do Brasil.

Hoje, tudo é diferente. A começar do próprio País, que vive uma democracia – e só quem conviveu com uma ditadura sabe como isso faz diferença. Naquela época, Lula e seus companheiros tinham todos os motivos para “lutar contra os patrões”, jargão dos grevistas, pois a maioria deles simplesmente não sabia conviver com greves e achava que todo grevista era um subversivo. E lutavam também contra o governo militar e a polícia, que os perseguia sem trégua. Hoje, grevistas invadem prédios públicos e ali se acomodam por dias e noites sem ser indomodados; ao contrário, ganham elogios do próprio presidente.

O mundo hoje também é completamente diferente. Não há mais o Muro de Berlim nem a Guerra Fria, os países comunistas praticamente desapareceram, e o próprio capitalismo – representado pelos EUA – dá sinais de decadência. Para que serve uma greve, nesse contexto? Aprendi no dia-a-dia que fazer greve é, se não a pior, uma das piores formas de lutar pelos seus direitos. Quando se para de trabalhar, principalmente se sua atividade é vital para outras pessoas (como é o caso de médicos, professores, policiais, profissionais de transporte público e uma série de outros setores), está-se prejudicando milhões de pessoas que nada têm a ver com os tais “patrões”. Pior ainda: quando você interrompe seu trabalho, perde totalmente a razão para reclamar do que quer que seja.

A melhor forma de pressionar seu patrão é mostrar a ele que você é competente no que faz e que sua saída trará grandes prejuízos para a empresa. Se você não está satisfeito com sua atividade atual, tem todo direito de procurar outra, e ninguém vai censurá-lo por isso. Pressionar o patrão com chantagens ou ameaças aos colegas de trabalho deveria ser crime, da mesma forma que uma empresa deixar de pagar a seus funcionários é atitude criminosa.

Tudo isso é ainda mais grave quando se trata de funcionários públicos, que por definição têm o dever de servir à população que paga seus salários. Conheço vários que têm essa mentalidade, mas infelizmente há muitos que acham estar fazendo um favor à sociedade quando lhe prestam atendimento. O fato de passar num concurso público não dá a ninguém o direito de desrespeitar quem procura seus serviços. E usar uma prerrogativa única – que é a de não poder ser demitido – para relaxar no trabalho, ou interrompê-lo através de uma greve, é inadmissível. Quem age assim também comete um crime.

Infelizmente, depois da “era Lula” o conceito de greve foi completamente distorcido no Brasil. O que era uma ferramenta da democracia foi transformado em arma daqueles que só querem manter privilégios e mordomias. Não é coincidência que muitos dos trabalhadores que lutaram ao lado de Lula nos anos 70/80 hoje ocupam altos cargos públicos, envolvidos em seguidos escândalos.

Foram espertos e aproveitaram bem a chance que tiveram. Mas fazem um mal enorme ao País. 

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