Qual é a banda larga que queremos?

Por Paulo Breviglieri

O consenso em torno da relevância das redes de banda larga é hoje absoluto. Sua importância em esforços de inclusão social, promoção da cidadania através do acesso irrestrito à informação e construção de uma sociedade mais justa e competitiva são inquestionáveis.

Governo, operadoras e fabricantes buscam elencar requerimentos e estruturar planos de ação específicos voltados à implementação de redes de banda larga em grande extensão. Tal consenso talvez não encontre paralelo na história, nem mesmo quando, há pouco mais de uma década, eram lançadas as bases dos projetos de universalização dos serviços de voz.

Entretanto, superada a unanimidade inerente ao consenso, pergunta-se: que banda larga queremos para um País de dimensões continentais que, a despeito da crescente maturidade de suas instituições e de sua política econômica, convive com problemas estruturais crônicos, como educação e saúde de baixa qualidade, escassos investimentos em infra-estrutura e rendimentos individuais ainda relativamente baixos? Como levar a banda larga ao cidadão comum, justamente aquele que mais demanda acesso ilimitado à informação.

A equação é complexa, e sua solução deve obrigatoriamente contemplar atributos específicos, como a utilização de tecnologias padronizadas de alto desempenho, escalas de produção globais, implementação simples e rápida a custos de capital e operacionais reduzidos, reaproveitamento máximo da infraestrutura existente, ampla oferta de dispositivos de massa, mobilidade plena.

Embora esta análise se debruce sobre a importância da tecnologia como elemento crítico, a relação não se esgota aqui, incluindo outras dimensões como a oferta de serviços aderentes às necessidades e ao poder aquisitivo do usuário, e de incentivos governamentais alinhados a políticas públicas para extensão da banda larga a toda sociedade, dentre outras.

Neste contexto, a banda larga móvel, materializada na forma de redes e dispositivos sem fio de terceira e quarta gerações (3G e 4G), apresenta-se como uma excelente alternativa para programas voltados ao desenvolvimento de uma sociedade conectada. Como são tecnologias abertas e padronizadas, viabilizam escalas de produção incomparáveis.

De acordo com analistas, somente as redes 3G servirão em 2013 cerca de 1,3 bilhão de usuários em todo o mundo – e, consequentemente, será extensa a oferta de dispositivos a preços reduzidos e competitivos. A exemplo do que se projeta para o cenário internacional, no Brasil, segundo a Pyramid Research, o número de acessos de banda larga móvel deverá crescer significativamente nos próximos dois anos, atingindo 18 milhões em 2011, superando o número estimado de acessos fixos (17 milhões).

O atendimento desta demanda efetiva-se através de uma crescente diversidade de dispositivos móveis. Se por um lado o advento da banda larga móvel fundamentou-se inicialmente na oferta de modems como elemento de conectividade para computadores, é evidente o crescimento sustentado da demanda e da oferta de outros dispositivos móveis que utilizam dados, como smartphones e netbooks.

Analistas prevêem que, em 2012, um em cada três celulares vendidos no mundo será um smartphone. Segundo dados da GfK, no Brasil a participação de smartphones no total das vendas de celulares 3G saltou de 3% para 17% nos últimos 12 meses.O surgimento de novas categorias de dispositivos, como os smartbooks, motivou a indústria a desenvolver soluções inovadoras para atendimento de requerimentos específicos.

Novas famílias de semicondutores, caracterizadas por incomparável nível de integração, alta capacidade de processamento, baixíssimo consumo de energia e suporte a diversas plataformas operacionais equipam a nova geração de dispositivos móveis conectados. Na medida de sua capacidade econômico-financeira, as operadoras brasileiras têm respondido à grande procura por acessos de banda larga móvel mantendo – e em alguns casos incrementando – todos os investimentos em suas redes 3G programados para 2009, a despeito da crise financeira internacional.

Mesmo assim, como a demanda é extraordinariamente grande, a ocupação das redes se deu de forma rápida. Hoje já constatamos a necessidade de capacidade adicional. Os horizontes de utilização das redes 3G no Brasil foram traçados por algumas operadoras: em não mais que dois anos alternativas de expansão deverão existir, do contrário o crescimento das operações e a oferta de banda larga móvel no País serão inviabilizados.

As operadoras brasileiras dispõem de alternativa tecnológica para evoluir suas redes 3G HSPA agora e, com isso, equacionar o atendimento da demanda no curtíssimo prazo. A implementação da tecnologia HSPA+ viabilizará não apenas o crescimento da capacidade sistêmica das redes, como propiciará também a oferta de serviços em patamar de desempenho superior.

Explorando os mesmos canais de frequência de 5 MHz utilizados em redes 3G HSPA, será possível atingir velocidade de download de até 42 Mbps. Combinando-se dois canais, até 84 Mbps. Segundo a GSA (Global Mobile Suppliers Association), 36 redes HSPA+ haviam sido lançadas até meados de novembro de 2009, e 62 operadoras já haviam confirmado seu comprometimento de evoluir suas redes a HSPA+.

Entretanto, a demanda por banda larga móvel continuará crescendo. Esgotadas as perspectivas que a evolução tecnológica das redes 3G oferece, torna-se premente planejar agora o passo seguinte: a identificação de novas faixas de frequência que viabilizem a implementação de LTE (Long Term Evolution), a tecnologia de quarta geração (4G), que constitui a evolução natural das redes 3G, apontada pela ampla maioria dos analistas como a tecnologia da próxima década.

A faixa de 2,5 GHz é inquestionavelmente “a” opção que se identifica para a oferta de banda larga móvel no Brasil, em função de todos os benefícios que lhe são inerentes: harmonização em âmbito global aderente a recomendações da UIT (União Internacional de Telecomunicações), ampla adoção em todo o mundo, economias de escala globais com LTE que crescerão a taxas anuais superiores a 400% (segundo a Pyramid Research), alinhamento de amplo ecossistema de desenvolvedores e oferta de extensa gama de dispositivos de massa a preços competitivos.

O movimento internacional em torno da faixa de 2,5 GHz é ímpar, não encontra precedentes na história. Privar-se dos inéditos benefícios associados a esta iniciativa constituiria um grave erro estratégico. O Brasil deve se engajar agora e buscar imediata reserva e redestinação da faixa de 2,5 GHz ao SMP, o que viabilizaria sua utilização para oferta de banda larga móvel no início da próxima década.

É premente uma rápida conclusão deste processo de forma que indústria e operadoras possam já planejar e desenvolver seus projetos conhecendo o ambiente regulatório de prestação do serviço e os horizontes de investimento aplicáveis.

A utilização da faixa de 450 MHz para propósitos de inclusão digital e oferta de banda larga móvel é também uma solução de grande interesse para o Brasil. A reorganização da faixa, objeto de consulta pública conduzida pela ANATEL há alguns meses, abrirá uma oportunidade adicional de atendimento à demanda por banda larga sustentada por tecnologia de ponta – o CDMA450 – e pela cobertura maximizada inerente à utilização de faixas de frequências baixas, particularmente relevantes para prestação do serviço não apenas nos centros urbanos, mas também em áreas remotas e rurais.

Estamos diante de uma grande oportunidade e um grande desafio. As propostas contidas na Carta do Guarujá, elaborada pela Telebrasil em agosto de 2009, constituem alicerces sólidos sobre os quais se deve edificar este grande projeto que é a massificação da banda larga no Brasil.

Cabe ao País conjugar o futuro de um presente positivo e promissor, transformando o consenso em torno da importância da banda larga em caso de implementação de referência mundial. Escolhas aderentes às demandas da sociedade, às principais tendências e aos movimentos estratégicos globais são muito bem-vindas. A banda larga móvel é a banda larga da Copa de 2014, das Olimpíadas de 2016, enfim, é a banda larga do futuro.

*Paulo Breviglieri é Diretor Corporativo e Country Manager da Qualcomm Brasil

Texto publicado no site Convergência Digital, em 18/01/2010