Em mais uma prova de que cultura não é prioridade “neste país”, o ministério que deveria cuidar da área foi usado como moeda de troca política. Nada tenho contra (nem a favor) a ministra que saiu; sobre a que entra, o fato de admitir, publicamente, que nada entende do assunto já fala por si só. Repete-se o famoso caso do Ministério da Pesca, entregue a um pastor protestante para acomodar interesses do governo com a comunidade religiosa (leia-se: TV Record).
Lamento não ser tão otimista quanto o brilhante colega Samuel Possebon, do site Tela Viva, que esta semana analisou em detalhes o que esperar da gestão Martha Suplicy. Possebon acha que pode haver uma reaproximação entre o Ministério e a Ancine, cujas relações andavam estremecidas na gestão Anna de Holanda. Sinceramente, não sei se isso é bom ou ruim. Nada deve mudar nos poderes da Agência, que hoje arrecada cerca de R$ 1 bilhão por ano em tributações sobre diversas atividades culturais, dinheiro que acaba nas mãos dos privilegiados cujos amigos se aninharam no comando do órgão. Como Martha é da política e tem pretensões eleitorais, sua prioridade será usar os recursos para atender a esses objetivos, como sempre acontece.
Já dei aqui minha opinião sobre o assunto. Não acho sequer que deva existir um Ministério da Cultura. Para ser tratado como prioridade, de fato, o setor não precisa de burocracia nem politicagem, muito menos cabides de emprego como a Ancine. Bastaria o governo, como um todo, estimular os produtores culturais que realmente precisam de apoio, via leis de incentivo isentas de nepotismo e apadrinhamento; e garantir a construção e manutenção decente de museus, bibliotecas, teatros, monumentos, edifícios históricos, cinemas de arte, enfim, itens que não consumiriam muito dinheiro do orçamento. Este deveria ser reservado às grandes urgências do país, como saúde, educação, transporte e segurança.
Mas, claro, isso é pura utopia, num país em que estatais como Banco do Brasil e Petrobrás são usados para patrocinar shows de rock, sites de artistas famosos, livros, jornais e revistas de amigos do poder, entre outras aberrações. Prefiro ficar com o excelente escritor Leandro Narloch, autor de obras como “História Politicamente Incorreta do Brasil”, um grande desfazedor de mitos e hipocrisias. Recomendo a todos seu artigo de hoje na Folha de São Paulo, sob o título “Ministério da Cultura, Ministério do Vento”. Em poucas linhas, ele conseguiu resumir essa (tragi)comédia de absurdos.