O relatório do Ibre-FGV indicando que jovens e adultos que estudaram mais tiveram perda de renda nos últimos dez anos é um tapa na cara de todos nós. Tragicamente, somos uma sociedade tolerante com a violência e o atraso, simbolizados na destruição do sistema público de ensino e na multiplicação de grupos econômicos que transformam a educação, cada dia mais, numa atividade voltada apenas ao lucro.

Esses dois fatores, somados ao descaso da maioria dos políticos, que só se lembra do assunto em época de eleições, explicam por que, segundo a pesquisa, segue crescendo o número de pessoas que estudaram no mínimo 9 anos e, não encontrando emprego após a formatura, caem na informalidade com renda precária. O repórter Fernando Canzian, da Folha de São Paulo, examinou o estudo ao lado de especialistas e chegou a conclusões vergonhosas para um país que sonha presidir o tal G-20 das nações mais ricas do planeta.

Como a querer confirmar falas de políticos demagogos (Lula e Bolsonaro entre eles), do tipo “eu cheguei até aqui sem estudar” ou “conheço melhor o país do que muito professor e cientista”, a pesquisa da FGV é histórica por revelar um Brasil invisível. Os pesquisadores identificaram pessoas que passaram mais de 16 anos na escola, apenas para ver sua renda despencar com a crise pós-2013.

Os dados são públicos (da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, do IBGE) e revelam que nosso sistema econômico vem criando mais empregos de baixa remuneração. O governo comemora quando sai um índice de desemprego em queda, e omite – a meu ver criminosamente – o outro lado da moeda: tem mais gente trabalhando por menos, ao passo em que se expande a chamada “geração nem-nem”.

Segundo a reportagem, na comparação com dados de 2012, alguém que estudou menos de 1 ano viu sua renda média crescer 27,5% até o segundo trimestre de 2023. Na escala desenhada pelos pesquisadores da FGV, esse percentual vai caindo na proporção inversa ao tempo de estudo da pessoa. Confiram:

1 a 4 anos de estudo: +5%

5 a 8 anos de estudo: +2,2%

9 a 11 anos de estudo: -2,9%

12 a 15 anos de estudo: -11,2%

16 ou mais anos de estudo: 16,7%

Todos nós conhecemos pelo menos um técnico de informática que ganha a vida como motorista de Uber, um economista hoje dono de boteco e assim por diante. Esse processo nem é tão novo assim. Em São Paulo, ficou famosa nos anos 80 uma lanchonete chamada “O Engenheiro que Virou Suco“, nome que é autoexplicativo.

A questão é que nenhum governo consegue interromper esse processo dramático, de forma sustentável, e a sociedade vai aos poucos agindo como se isso fosse normal. As pessoas se unem, por exemplo, para ir às ruas gritar por este ou aquele político, mas não há notícia de protestos contra a má qualidade da educação em geral, só para ficar num exemplo.

“O ensino superior está dando menos retorno no Brasil”, diz o economista Fernando Veloso, um dos autores do relatório IBRE-FGV. “É um claro indicador de uma economia pouco dinâmica, com empresas pouco ativas e outras mais produtivas que não crescem”. Com raras exceções, a reação dos empresários, através de suas entidades lobistas, é pedir mais subsídios e/ou redução de impostos.

Pleitos que o governo atende ao sabor de suas conveniências político-eleitorais, como se viu recentemente com as medidas de apoio à indústria automobilística. Investimento e emprego, que é bom, há tempos deixou de ser prioridade.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *