Lições de ‘In Rainbows’

Por Lena Castellón
Um relatório preparado por um economista e um executivo de uma empresa especializada em fazer medições da mídia online trouxe, mais uma vez, o Radiohead e seu álbum In Rainbows para o centro de discussões a respeito do futuro da indústria da música.

O trabalho assinado por Will Page, diretor da MCPS-PRS Alliance (entidade britânica de direitos autorais), e Eric Garland, co-fundador e CEO da Big Champagne Media Measurement, aponta que a distribuição de In Rainbows, de fato, sinaliza um novo paradigma, por mais que os críticos da estratégia “pague quanto quiser” torçam o nariz quando se toca no assunto.

Vale a pena relembrar o caso. O notório álbum – o sétimo da carreira da banda inglesa e o primeiro após um hiato de quatro anos – foi lançado em 10 de outubro de 2007 para download no site criado pelo Radiohead. Ao fã, bastava fornecer alguns dados, entre eles o e-mail, e pagar o que quisesse. Inclusive nada. Qual o ponto negativo segundo os críticos?

Apesar da oportunidade de obter as músicas “na faixa”, imediatamente as canções de In Rainbows passaram a ser distribuídas pelas redes de compartilhamento de arquivo, pelos torrents da vida. Ou seja, ainda que tenha sido oferecida uma via legal – e até gratuita, dependendo da disposição do fã –, as pessoas continuaram baixando o álbum pela forma ilegal. Na visão desses representantes da indústria, portanto, o Radiohead teria fracassado.

De acordo com a análise de Page e Garland, a estratégia do Radiohead compensou o risco. O relatório mostra que os usuários de redes do tipo torrent baixaram 400 mil cópias de In Rainbows em 10 de outubro. E até 3 de novembro o álbum foi compartilhado 2,3 milhão de vezes. Para comparar, os autores do relatório citam o desempenho de lançamentos de três bandas diferentes, todas badaladas, no sistema P2P (o dos tais torrents): Gnarls Barkley, Panic at the disco e Portishead. Quem se saiu melhor foi o Panic at the disco, com um pico de 157 mil downloads em uma semana, muito abaixo do que In Rainbows conseguiu naquele 10 de outubro.

Antes que alguém diga “OK, os piratas são fãs do Radiohead”, é preciso estudar o caso com mais cuidado. É isso que Page e Garland sugerem para a indústria da música. Primeiro: mesmo com o pesado compartilhamento, as vendas do álbum físico foram excelentes (atingiram o primeiro posto das paradas inglesas e americanas logo de cara). Segundo: a experiência foi um sucesso ao gerar um formidável  impacto de popularidade. Terceiro: a turnê do Radiohead está disputadíssima, mesmo com tantos festivais de rock lutando pelo interesse do público (pela primeira vez em anos, o famoso festival de Glastonbury não teve vendas esgotadas).

Sobre o fenômeno pairam dúvidas importantes: a performance do Radiohead foi tão boa porque eles estavam sem lançamentos havia tempos? Foi boa porque, afinal, é o Radiohead e mais ninguém conseguiria isso? A experiência não afetou a venda de álbuns físicos porque quem compartilhou queria mesmo ter o CD? Quem compartilhou o fez porque o sistema do Radiohead não era assim tão eficaz (o site travava ou demorava para o fã receber o reply e fazer download, e a qualidade do áudio não era das melhores)? A intensa troca via torrent acabou atuando como ferramenta de promoção?

Não se sabe quanto o álbum vendeu no site aberto pelo Radiohead. Mesmo sem ter acesso a esses dados oficiais, Page e Garland têm uma hipótese. Muitos fãs de música tornaram o compartilhamento de arquivos uma prática regular. Portanto, não é a simples oferta que despertará a atenção deles. É preciso que seja algo realmente forte para exercer tamanho fascínio. Outro ponto: não se pode ignorar o poder das redes de compartilhamento, por mais que isso soe intragável para a indústria. Sites como Pirate Bay tornaram-se marcas poderosas para esses consumidores, especialmente os jovens.

Os autores do relatório afirmam ainda que o grupo Nine Inch Nails, que também forneceu arquivos musicais via site (não todo o álbum, apenas algumas canções gratuitamente), aprendeu com a experiência do Radiohead – que não se repetirá, alertou o líder da banda, Thom Yorke.

© MM ONLINE (07/08/2008)