O Acordo de Tecnologia da Informação da OMC e o Brasil

Por Eduardo Felipe Matias*

Foi decidido, no final de julho, que o acordo de tecnologia da informação (ITA, na sigla em inglês) da Organização Mundial do Comércio, assinado em 1996, será ampliado a fim de zerar as tarifas de importação de 200 produtos adicionais, cujo comércio é estimado em mais de US$ 1 trilhão por ano. Trata-se da primeira grande negociação na OMC para redução de alíquotas em 18 anos.

O Brasil, no entanto, está de fora desse acordo.

É verdade que o País, como membro da OMC, se beneficiará, indiretamente, da isenção de tarifas, uma vez que vigora naquela organização a chamada “cláusula da nação mais favorecida”, que estabelece que um benefício concedido a um país membro deve ser estendido a todos os demais. Logo a alíquota zero para os produtos listados pelo ITA se aplicará também às exportações brasileiras.

No entanto, a não adesão a acordos como esse dificulta nossa inserção nas cadeias produtivas globais, privando nossas empresas do acesso a insumos mais baratos, o que leva a perda de competitividade e diminuição do bem-estar da população como um todo.

Isso porque, se por um lado pode haver uma boa intenção por trás da ideia de se proteger um determinado setor, preservando empregos, por outro lado essa proteção pode acarretar alguns efeitos negativos. Muitos dos itens abrangidos pelo ITA são insumos para a fabricação de produtos em outros setores industriais. Zerar as alíquotas de importação desses insumos poderia, assim, reduzir os custos de produção nesses outros setores, tornando-os mais competitivos. Tornaria, também, o País mais atraente para empresas estrangeiras que poderiam optar por se instalar aqui, gerando mais investimentos e, portanto, novos empregos. E beneficiaria, de forma geral, os consumidores graças à diminuição do custo de vida.

Alguns desses efeitos são preocupantes para um país que já exporta pouco – apesar de sermos a 7ª ou 8ª economia do mundo, continuamos em 22º lugar no ranking das exportações mundiais, com participação de apenas 1,3%. Burocracia excessiva, alta carga tributária, deficiente infraestrutura e capital humano pouco capacitado explicam em grande parte porque isso acontece. Mas colabora também para essa realidade a nossa baixa adesão a acordos de livre comércio e de reduções tarifárias.

Existe, é verdade, justificativa na teoria econômica para proteger as chamadas “indústrias nascentes” – aquelas que, em seu início, só serão capazes de se desenvolver se não tiverem que enfrentar a concorrência de competidores estrangeiros já estabelecidos. Porém, não adianta apenas proteger as indústrias sem que se promova, em paralelo, uma agenda que procure consertar as deficiências estruturais que estão na raiz das dificuldades por elas enfrentadas. Sem isso, velhos erros voltarão a ser cometidos. O protecionismo gerou uma indústria automobilística que um tempo atrás foi acusada de produzir carroças. No setor de brinquedos, embora salvaguardas tenham sido implantadas na década de 1990, os importados ainda representam cerca de 50% do mercado doméstico e os empresários nacionais continuam insatisfeitos, uma vez que aquelas medidas não foram acompanhadas de políticas de longo prazo que lhes permitissem concorrer em pé de igualdade com as empresas estrangeiras.

Isso se aplica ao setor da informática e eletrônicos, que foi protegido pela reserva de mercado dos anos 1980 e pela não adesão ao ITA em 1996. De lá para cá, não se evoluiu para uma situação em que essa indústria não precisasse temer seus competidores estrangeiros e, quase 20 anos depois, a adesão ao ITA continua a ser encarada como inviável.
Logo, apenas limitar a concorrência não resolve o problema. Eventuais medidas de proteção devem vir acompanhadas de ações consistentes para combater nossa ineficiência e promover a nossa competitividade. Só assim conseguiremos aumentar a nossa inserção nas cadeias produtivas que estão se formando ao redor do mundo, acompanhando, assim, essa inevitável tendência trazida pela globalização econômica.

*Sócio de Nogueira, Elias, Laskowski e Matias Advogados. Autor dos livros “A Humanidade contra as Cordas: a luta da sociedade global pela sustentabilidade” e “A Humanidade e suas Fronteiras: do Estado soberano à sociedade global”, vencedor do Prêmio Jabuti de 2006 na categoria Economia, Negócios, Administração e Direito. Twitter: @EduFelipeMatias