Certas notícias parecem saídas dos livros de ficção científica para aterrisar em algum ponto do território brasileiro. Uma das últimas é a do projeto de instalação de uma “usina de dessanilização” em Fortaleza, uma das maiores cidades do país, mais precisamente na badalada Praia do Futuro. Quando li pela primeira vez, há cerca de um mês, achei que era fake news: como seria possível tal projeto num centro urbano como esse, aliás orgulho dos cearenses e visitado diariamente por milhares de turistas?

Bem, o projeto do governo estadual não só existia como já está em pleno andamento, apesar de centenas de manifestações contrárias de especialistas no assunto (este link traz os detalhes). A reação escalou quando se descobriu que exatamente ali, na altura da Praia do Futuro, fica o chamado “grande hub submarino” das Américas. No continente, o local é o ponto mais próximo da Europa e dos EUA, e por isso foi escolhido há anos pelo consórcio internacional que administra as redes de telecomunicações.

São, ao todo, 18 cabos como o da foto, que permitem a comunicação das três Américas (EUA inclusive) com o resto do mundo. Estão conectados a uma base montada a cerca de 20m da superfície, dali saindo cabos por outras bases em direção ao hemisfério norte, sempre pelo fundo do mar.

Segundo o governo cearense, a usina instalada na praia irá captar a água do mar e filtrá-la para abastecer a rede hídrica da região metropolitana. O risco, dizem as teles e vários pesquisadores que têm se manifestado pela mídia, é de que essa estrutura atinja os cabos de telecom, o que causaria pane nos sistemas de telecomunicação não só do Brasil como de todos os países envolvidos. Algo como um grande apagão de internet!

Não tenho condições de opinar sobre o tamanho desse risco. Mas bate uma espécie de vergonha alheia – mais uma, aliás – ao ver como funcionam alguns órgãos públicos no Brasil. Será que a Prefeitura de Fortaleza e a Cagece, estatal encarregada do projeto, não sabiam que bem ali havia um hub gigantesco? Estranho, porque o próprio governo do Estado cantou glórias quando a Praia do Futuro foi escolhida para receber o hub.

Neste domingo, em entrevista à Folha de São Paulo, o vice-presidente da operadora Claro, Fabio Andrade, diz que o projeto previa uma distância de apenas 5 metros entre os dutos de dessanilização e os cabos de telecom. 5m!!! Diante da gritaria, a Anatel – que até então também se mantinha muda sobre o caso – ordenou que a distância seja de pelo menos 500 metros. Mesmo assim, segundo Andrade, a vibração da água provocada pelo duto pode, a médio prazo, provocar até o rompimento dos cabos. “Com o crescimento da demanda, planejamos dobrar a quantidade de cabos em três anos. Para isso, seria preciso uma distância de, no mínimo, 1.000 metros”.

É de se imaginar a cara de americanos, ingleses, franceses, italianos e demais estrangeiros que confiaram esse hub aos brasileiros. Espero que não aconteça, mas se houver o tal “apagão da internet”, já sabemos quem são os responsáveis.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *