Por Luís Osvaldo Grossmann*
Projetos em desenvolvimento no Brasil sugerem que as aplicações do smart grid – a rede inteligente de energia elétrica – farão uso de diferentes tecnologias de telecomunicações, desde a telefonia móvel até a TV Digital. As soluções aos consumidores, no entanto, vão depender do caminho escolhido pelas diferentes distribuidoras de energia, de olho no modelo de negócios mais interessante para cada região.
Tome-se os exemplos da Cemig e da Light, cuja abordagem parte do desenvolvimento de um medidor eletrônico que permita o acompanhamento do consumo e a gestão mais eficiente do uso doméstico da energia elétrica. Além de buscar um equipamento com custo mais baixo que os similares importados, o projeto considera apresentar as informações via TV Digital.
“As informações poderão ser lidas pelo conversor e a TV Digital seria a interface para os consumidores. O desafio é fazer um protótipo com custo muito inferior aos equipamentos importados, que estão na faixa de US$ 300 ou US$ 400. Mas com funcionalidades que atraiam os consumidores, porque sem eles os ganhos do smart grid não se justificam”, salienta o coordenador do grupo de smart grid do CPqD, Luiz José Hernandes Júnior.
O CPqD participa das atividades de pesquisa e desenvolvimento desse medidor eletrônico desejado pela Light e pela Cemig, mas Hernandes lembra que a implementação do smart grid no país abrirá diferentes oportunidades de novos negócios com o uso das telecomunicações. “Sabemos que na Europa o smart grid já é utilizado para monitoramento médico. Com o uso de uma pulseira ou um colar é possível detectar até mesmo quedas de um consumidor idoso, por exemplo”, conta.
O uso das telecomunicações também pode se dar com aparelhos celulares para acionar equipamentos à distância – como iluminação, irrigação ou alarmes. “As funcionalidades vão muito além do serviço anterior [de energia], e com a configuração de uma rede doméstica [home area network] podem ser aportados outros serviços. E os serviços agregados vão surgir naturalmente com o desenvolvimento da tecnologia e a partir dos modelos de negócios adotados”, completa Hernandes.
O CPqD, no entanto, calcula que ainda é cedo para apostar em uma tecnologia dominante para o smart grid. Diferentes soluções – seja com PLC, Zigbee, WiFi, WiMAX ou RF Mesh – serão adotadas a partir das premissas de cada distribuidora de energia. “O PLC, com uso de banda estreita, pode ser uma boa solução para regiões isoladas. Já naquelas com altíssima concentração de clientes a tendência deve ser o uso de redes próprias, com backhaul ou WiMAX”, avalia o coordenador do CPqD.
Uma das principais discussões sobre a implantação do smart grid no país passa pelo financiamento dessa rede inteligente. O tema faz parte do grupo de trabalho criado no Ministério de Minas e Energia que discute uma política pública para essa nova rede, especialmente pela definição de um modelo que evite impactos nas tarifas aos consumidores. Mas, embora as projeções de custo variem de R$ 50 bilhões a R$ 200 bilhões, também faz parte da equação a perspectiva de que os próprios ganhos do smar grid compensarão os aportes necessários.
“Os ganhos com o smart grid são muitos e acredita-se que eles serão suficientes para financiar esse investimento. A questão que se coloca é como começar esse círculo virtuoso, daí a necessidade de uma política pública para os investimentos iniciais”, avalia o coordenador do grupo de smart grid do CPqD, Luiz José Hernandes Júnior.
Com a medição eletrônica em larga escala as distribuidoras de energia vão perceber esses ganhos na redução de perdas – os “gatos” – além de que a rede inteligente permitirá o uso mais eficiente da energia, a redução do consumo nos horários de pico e o consequente adiamento de investimentos.
Isso porque um dos elementos básicos do smart grid é permitir que os consumidores utilizem a energia de forma mais eficiente. Daí o processo começar com a troca dos medidores atuais por equipamentos capazes de fornecer informações mais completas. A partir daí, a Agência Nacional de Energia Elétrica planeja adotar tarifas diferenciadas.
Com isso, será possível “recompensar” aqueles consumidores que, por exemplo, usam o chuveiro elétrico fora do horário de pico. “Os consumidores precisam perceber os ganhos com as mudanças de comportamento”, avalia Hernandes, do CPqD. Ou seja, o cliente precisa sentir, mantendo o exemplo, que será mais barato tomar banho depois das 22h.
O impacto dessa mudança de comportamento não é trivial. As redes de energia são desenhadas para suportarem o uso nos horários de pico de consumo, o que significa sobra de capacidade nos demais períodos. Daí um primeiro ganho com alguma diluição desse consumo, inclusive pelo impacto na vida útil do sistema.
A medição inteligente também permite a identificação e o combate mais eficaz ao que o setor elétrico chama de “perdas não técnicas”, ou seja, o “furto” de eletricidade. De novo, o número não é desprezível. Calcula-se que esses “furtos” representem metade das perdas de eletricidade do sistema – as perdas técnicas sendo aquelas naturais à própria transmissão – que chega, em média, a 16% de toda a eletricidade produzida no país.
*Texto publicado no Convergência Digital, em 13/10/2010