Uma indústria em processo de transição

Por Steve Smith*

Acabo de chegar da CEATEC, realizada próximo a Tóquio, onde como sempre vimos uma série de novos produtos, especialmente portáteis, destinados ao mercado asiático – alguns deles provavelmente serão lançados também nos EUA e Europa em 2010. Esse evento será lembrado como um show “3D HD”, e não duvido que iremos ver e ouvir muito sobre esse tema no ano que vem, considerado o apoio dos estúdios de Hollywood e de grandes fabricantes, como Panasonic, Sony, Toshiba e Sharp.
No entanto, fui tudo que vimos. Ao final da chamada “década digital”, em que a indústria como um todo praticamente abandonou os produtos analógicos, um revendedor pode sentir-se no direito de perguntar: “Será que é só isso”? Nos últimos anos, tivemos inovações como os cartões de memória flash, as câmeras digitais, vários tipos de discos ópticos, players MP3 de todos os tipos e tamanhos e enormes avanços nas áreas de PCs, celulares e PDAs. Houve ainda as guerras de formatos em várias categorias de produtos, sem falar nos diversos padrões de HDTV.
Parece que, depois de dez anos de revoluções, os grandes fabricantes japoneses decidiram dar um tempo. Não que não haja motivos, e o primeiro e mais importante é, sem dúvida, a recessão mundial, que afetou os japoneses mais do que todo mundo. A Sanyo está sendo incorporada pela Panasonic, a Pioneer abandonou o segmento de displays, e quase todos os grandes grupos apresentaram balanços negativos nos últimos 18 meses.
Pode-se teorizar – como ouvi durante a CEATEC – que talvez os fabricantes estejam esperando a crise passar para voltar a lançar novos e revolucionários produtos. Fora do Japão, a crise chegou justamente no momento em que a TV Digital era introduzida ao grande público. Lembro das palavras de Brian Dunn, CEO da rede Best Buy, que há poucos dias comentou que a HDTV está apenas “dando os primeiros passos”. Segundo ele, a chegada da alta definição e dos displays finos é um daqueles eventos que só acontecem a cada 25 anos, obrigando todos os consumidores a pelo menos pensar em trocar de TV.
Acrescento que o mesmo poderia ser dito sobre outras categorias de produtos, cujas características estão mudando com a transição digital. Mas o que a indústria precisa entender é que estamos entrando numa fase “evolucionária”, e não “revolucionária”. Teremos agora alguns poucos avanços significativos (um deles sendo a TV 3D), e muitos pequenos avanços. Mas deveremos ter menos produtos que se enquadrem na categoria do “must-have”, aqueles que todo mundo deve ter.
Pode também ser um cenário mais difícil, pois na última década os fabricantes se acostumaram a demonstrar e vender produtos realmente diferenciados, graças à evolução digital. As diferenças agora não serão tão perceptíveis. Lembro que no final dos anos 80, quando todo mundo na indústria estava esperando pelo “novo videocassete”? Pois é, foi uma época em que os preços e as margens de lucro caíram a ponto de a maioria dos equipamentos ser considerada commodity. Uma época que ninguém quer de volta.
Nos últimos 25 anos, o crescimento da indústria eletrônica de consumo sustentou-se nos produtos de entretenimento residencial, equipamentos automotivos, videogames, telefones e computadores. Hoje, os revendedores – especialmente alguns com quem conversamos durante a última CEDIA Expo – esperam pelo que chamam de produtos “não-tradicionais”, que compensem os lucros perdidos com os produtos de entretenimento doméstico.
Esses novos produtos poderão ser, pelo que vimos na CEATEC, de categorias como os “ecológicos” ou os relacionados a cuidados com a saúde. No Japão, há grande interesse por aparelhos que consomem menos energia e apresentem menor emissão de gás carbônico, assim como pequenos dispositivos que medem os sinais vitais de uma pessoa, por exemplo. Boa parte desses produtos será integrado aos demais equipamentos da casa, o que sem dúvida exigirá mais especialização de revendedores e projetistas.
Mas será que a indústria como todo irá se envolver mesmo nessas questões? Seria um salto e tanto, para quem se acostumou a lidar com receivers, caixas acústicas, toca-discos e demais itens que tanto agradavam às gerações passadas. No final desta década, fica claro que não apenas a economia mudou – as necessidades do consumidor também. E bem na hora em que a indústria está em condições de oferecer novos produtos para atender a essas necessidades.
Podemos estar entrando numa nova transição – dos aparelhos para entretenimento e comunicação aos aparelhos para preservar o meio ambiente e cuidar da saúde. É bom ficar atento a essas mudanças.
* Artigo publicado originalmente na revista Twice, em 09/10/09