Emissoras temem banda larga na TV

Por Fernando Lauterjung*

O lançamento no Brasil, recentemente, do primeiro modelo de “broadband TV” (televisores com acesso direto a conteúdos da internet) não passou de forma desapercebida pelos radiodifusores. E, claramente, não os deixou confortáveis com a possibilidade a chegada de mais um elemento para disputar a atenção do consumidor e o espaço na tela.

A primeira broadband TV do Brasil, fabricada pela Samsung, é capaz de acessar conteúdos do Terra, do YouTube e de outros parceiros de conteúdo, desde que conectada à banda larga. Ela foi o centro de um debate encabeçado por Fernando Bittencourt, diretor de tecnologia da TV Globo, no Congresso da SET nesta quinta-feira.

Logo no início, aparentemente de forma acidental, a TV, que estava conectada em banda larga, exibiu um vídeo do YouTube recheado por palavras de baixo calão em inglês. O operador do controle remoto da TV ultra moderna levou algum tempo para conseguir apertar o botão “pause”, o que acabou arrancando gargalhadas da plateia. Bittencourt lembrou, antes de iniciar os debates, que a internet é um ambiente desregulamentado. “Isso tem impactos, já que a TV tradicional tem regras como classificação indicativa”, disse.

Bittencourt afirmou ainda que a TV “cada vez mais se confunde, em termos tecnológicos, com o computador” e destacou que, graças ao acesso à banda larga, passa a contar com oferta ilimitada de conteúdo. Contudo, destacou que a TV, tradicionalmente, é um equipamento que proporciona uma experiência coletiva de assimilar conteúdo, e questionou se não haveria agora um antagonismo, já que a internet seria uma mídia “individual”. “Será que, ao buscar um conteúdo no YouTube na TV da sala, o sujeito não vai desagradar ao restante da família?”, perguntou.

TV individual

Virgílio do Amaral, diretor de tecnologia da TVA, discordou de Bittencourt afirmando que o conceito da TV única na residência vem perdendo relevância. “80% dos assinantes de TV têm dois pontos ou mais na casa. Não vemos mais como uma mídia de família, mas como algo segmentado dentro da residência”, disse o executivo.

A TVA, em parceria com a Telefônica, oferece em alguns bairros de São Paulo um serviço de vídeo sobre fibra óptica, no qual trafega, além dos canais lineares da TV por assinatura e canais pay-per-view, vídeo sob demanda através de uma locadora virtual com 600 títulos. Bittencourt lembrou que a TV também está mudando, tendo um salto de qualidade com o HD. “A alta definição está trazendo a família para a sala novamente. Durante muitos anos, isso vai perdurar. No quarto não tem alta definição”, disse.

Tiago Ramazzini, diretor do centro de competência de internet do Terra, afirmou que o compartilhamento da TV na sala pode também ser natural. “Uma família pode eventualmente buscar uma notícia sobre o clima, ou sobre o resultado do jogo do Grêmio”, disse. O executivo do Terra destacou que o portal hoje oferece apenas conteúdos na forma de widgets, aplicativos que se sobrepõem às imagens da televisão. A ideia é que no futuro o portal também ofereça vídeo, sempre de forma gratuita, com modelo de negócios baseado em publicidade.

Receitas

Sobre a publicidade, Rodrigo Köpke Salinas, advogado do escritório Cesnik, Quintino e Salinas, afirmou que colocar estes aplicativos, sobretudo com publicidade, sobre o conteúdo da TV aberta, fere os direitos autorais do radiodifusor, dono do conteúdo. “A sobreposição de conteúdos só é possível se houver autorização do titular do conteúdo”, disse.

Questionado se o conceito não seria o mesmo do antigo recurso de “picture-in-picture”, embarcado em alguns televisores e que permite assistir mais de um canal simultaneamente, Salinas disse que não. Segundo ele, no picture-in-picture há uma separação do conteúdo, seja quando a tela está dividida em dois, seja quando um segundo conteúdo é sobreposto, desde que com uma margem separando do conteúdo do canal.

Bittencourt destacou que em mercados mais avançados, que já contam com este tipo de dispositivo há mais tempo, a audiência da TV não caiu. “Apenas 20% dos broadband TVs estão efetivamente ligados à internet”, disse. “Mas é uma questão de criar o hábito”, admitiu.

Amaral, da TVA, finalizou com uma provocação. Para ele, o grande desafio das emissoras é manter a audiência. “Como fica o horário nobre com a segmentação e a oferta ilimitada de conteúdo? Se os canais abertos perderem o futebol, por exemplo, a competição fica difícil”, disse.

*Artigo publicado no site Tela Viva em 27/08/09