“Depois de examinar cuidadosamente as provas e os depoimentos das testemunhas, o tribunal chega à seguinte conclusão: o Google é monopolista, e vem agindo unicamente para manter seu monopólio”.

 

Foi assim, sem meias palavras, num calhamaço de 277 páginas, que o juiz federal Amin Mehta, de Washington, anunciou na última 2a feira a primeira punição significativa à empresa mais poderosa do mundo. De início, as acusações são duas: manipular resultados de seu mecanismo de buscas, o mais usado em todo o mundo; e impor a fabricantes de smartphones a instalação do mecanismo como default nos aparelhos. Outras alegações levantadas pelo Ministério da Justiça americano ainda serão julgadas.

O mais incrível – embora não surpreendente – é que entre os fabricantes citados destaca-se a Apple, conivente num acordo secreto que agora pode causar boas dores de cabeça às duas empresas. Na verdade, a Alphabet, dona do Google, “comprou” essa submissão de seus parceiros: somente em 2021, foram cerca de US$ 26 bilhões, segundo o Ministério da Justiça, que desde de 2016 vinha investigando a suspeita. Os agentes federais atuaram em colaboração com colegas de 22 estados americanos que moveram ações judiciais contra a empresa – a Apple teria recebido a maior parte desse valor.

É impossível calcular quanto o Google lucrou com essas operações, mas um número talvez sirva para dar uma boa ideia: somente em 2023, o mecanismo de busca – aquele mesmo que todos nós usamos para fazer pesquisas na internet – rendeu à empresa um faturamento superior a US$ 240 bilhões! Advogados do Ministério afirmaram ao site npr.org que o Google vem usando seu monopólio para aumentar artificialmente seus preços de publicidade, para atingir valores como esse.

Ex-funcionários do Google falaram à Justiça

Nem Apple nem Alphabet desmentiram o acordo, o que, por si só, já sinaliza que a acusação é verdadeira. Durante o processo, os agentes colheram depoimentos de funcionários e ex-funcionários do Google, da Apple e de outras empresas envolvidas, e foram esses relatos que deram suporte à decisão do tribunal.

Pelas leis antitruste americanas, esse tipo de ação conjunta não pode ser feito em sigilo. Se os contratos do Google fossem tornados públicos, teriam sido anulados de saída por qualquer tribunal. Como os lucros eram, digamos, compartilhados com as empresas parceiras, todo mundo concordou em manter o sigilo. Os investigadores apontaram diversas cláusulas típicas de uma relação abusiva, decorrente, segundo o juiz Mehta, da liderança inconteste da empresa fundada por Larry Page e Sergei Brin.

O processo do Ministério – ou seja, do governo americano – contra a Alphabet teve início em 2020 e, pelo que se ouve entre especialistas, está longe de terminar. Em setembro, acontece uma nova etapa no Tribunal Federal de Washington, em que os juízes estabelecerão a multa a ser aplicada à empresa, provavelmente na casa dos bilhões.

Independente dessa pena, análises publicadas durante a semana em vários sites de tecnologia dos EUA apontam algumas consequências prováveis da punição. Uma delas seria exigir a divisão da empresa Google, separando o mecanismo de buscas da área de publicidade. Outra seria obrigá-la a abrir seus contratos, eliminando cláusulas como as que levaram aos processos atuais.

O que mais se teme no Vale do Silício, porém, é um efeito dominó atingindo outras big techs, como Amazon, Meta e Microsoft, que também têm seus telhados de vidro. Por ora, o Google promete levar o caso à Suprema Corte, que muito provavelmente só se manifestará em 2026. Até lá, tudo continuaria como está.

 

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