Tento me policiar para não ser saudosista demais, mas às vezes não tem jeito: a morte, hoje, de José Vasconcelos me fez lembrar da minha infância na frente da televisão. Mais ainda: me fez pensar em como até o humor brasileiro está decadente. Sim, temos todos que nos adaptar às mudanças, e nosso ramo de tecnologia é certamente um dos que mais exigem essa capacidade de adaptação. Mas, sinceramente, não consigo achar muita graça na maioria dos atuais comediantes ditos “stand-up”. Devo estar superado, ou algo assim, porque vários deles vivem batendo recordes de audiência na TV e de cliques na internet.
Para quem não sabe, José Vasconcelos foi quem inventou esse formato de comédia, primeiro no rádio (conseguia ficar no ar falando e contando piadas por horas…), depois no teatro e, a partir dos anos 50, na televisão. Trabalhou no primeiro programa humorístico da televisão brasileira, “A Toca do Zé”, na TV Tupi, em 1952. E foi responsável por uma proeza até hoje não igualada: em 1960, gravou um disco (no formato LP, de vinil) só de piadas. Chamava-se “Eu Sou o Espetáculo” e, pelos registros da época, vendeu mais de 100 mil cópias (vejam acima a capa).
Fez também cinema, mas seu forte era tomar conta do palco, sozinho, e engatar, uma atrás da outra, as piadas que nos faziam quase morrer de rir. Também era exímio imitador: os políticos da época eram suas “vítimas” preferidas. Algumas de suas piadas eram até surradas, mas a forma como ele as contava não tinha igual. Nunca precisou criar tipos, como seus contemporâneos Ronald Golias, Chico Anysio e Jô Soares, todos geniais na arte da comédia, cada um a seu estilo. Era, simplesmente, José Vasconcelos, de cara limpa, geralmente paletó e gravata, dicção perfeita e memória prodigiosa.
Também, e esse para mim é o ponto crítico, nunca precisou humilhar ninguém, nem falar palavrões (muito menos fora do contexto), nem praticar preconceitos, apelar para sexo, religião ou outros temas delicados. Infelizmente, os comediantes atuais não puderam vê-lo em cena (no YouTube há alguns vídeos e áudios seus). Teriam muito que aprender. Era, apenas e tão somente, um comediante. De pé.
