Neste momento de tanta efervescência política, quase passou batido, no último sábado, a passagem dos 25 anos da LGT (Lei Geral de Telecomunicações). Foi em 1997 que o governo FHC conseguiu aprovar no Congresso essa verdadeira revolução que, por absurdo que pareça, até hoje é criticada.

A piada de que, não fosse pela LGT, estaríamos ainda hoje falando em orelhões e não em celulares, não está muito longe da realidade para quem viveu aquele final de século 20. Até então, na era pré-telefonia móvel, conseguir uma linha telefônica era privilégio de poucos. Lembro de ter pago pela minha algo em torno de 6 mil cruzados – ou cruzeiros, não sei ao certo -, algo que devia ser equivalente a R$ 6.000 de hoje. Conheci pessoas que pagaram o dobro, e muitos assessores financeiros aconselhavam seus clientes a “investir” em mais contas telefônicas.

Além de caro, era um serviço precário; comemorava-se quando uma ligação se completava ou transcorria sem queda de sinal. E a batalha para conseguir uma linha era digna de um decatlo olímpico: esperei dois anos pela minha (fixa).

Por que privatizar?

A explicação para tanto desrespeito com o cidadão era simples: o país estava quebrado e o setor de telecom era exclusividade de empresas estatais, o chamado Sistema Telebrás, que agrupava as telefônicas estaduais (Telesp, Telerj etc). Quase todas eram descaradamente usadas pelos governadores de plantão, numa farra que, além de aumentar a dívida externa do país, produzia péssimo atendimento ao público (alguém lembra das fichinhas de orelhão?).

 

Com a LGT, o Sistema Telebrás foi desmontado, sendo criada a Anatel, uma das nossas primeiras agências reguladoras, copiando o modelo de países como EUA, Reino Unido e outros. Iniciou-se o processo de privatização do setor, com as antigas operadoras estaduais sendo leiloadas para grupos privados, inclusive alguns estrangeiros. A LGT mudou quase todas as regras de prestação de serviços.

Segundo os registros da Anatel, em 1997 o Brasil tinha 167 milhões de habitantes e somente 17 milhões de linhas telefônicas fixas, 4,5 milhões de linhas móveis e 2,5 milhões de assinantes de TV paga. Falido, o Sistema Telebrás não tinha como ampliar esses números, perpetuando um serviço restrito às elites e mantendo as empresas a anos-luz de qualquer tipo de competitividade.

Evidentemente, é impossível saber o que aconteceria se a LGT não tivesse sido promulgada – até porque o governo caminhava para um default de sua dívida externa, cuja renegociação havia sido iniciada em 1993, após o desastre Collor. Mas a simples ideia de tirar o país daquele atraso abjeto já podia ser então considerada uma vitória.

Interferências políticas

Os números atuais da Anatel não mentem: a LGT e o processo de privatização do setor de telecom foram um sucesso absoluto, qualquer que seja o parâmetro de análise. Não porque temos hoje (dados de abril) nada menos do que 334,5 milhões de contas ativas, entre telefonia, banda larga e TV por assinatura. Mas porque telecom passou a ser considerado um “serviço essencial” e, como tal, disponível para todos os brasileiros.

Claro que há inúmeras falhas, a começar da própria concentração do setor em apenas três grandes empresas: Vivo, Claro e Tim. Nesse meio tempo, tivemos os vários escândalos da Oi, herdeira da antiga Telemar financiada com dinheiro público, algo que contradiz todo o espírito da LGT. Houve ainda diversas denúncias sobre a promiscuidade (ou “excesso de intimidade”) entre dirigentes da Anatel e as operadoras, casos que geralmente acabam engavetados.

 

Lembro de ter entrevistado o grande Renato Guerreiro, primeiro presidente da Anatel e figura-chave na história das Comunicações (vejam aqui), dizendo que a LGT e a independência do órgão eram uma conquista de todos os brasileiros.

Pois sim. A partir do governo Lula, aumentaram as interferências e as indicações políticas na Agência, que poderia estar fazendo muito mais do que faz hoje. Para quem não viveu aqueles tempos, ou se esqueceu, basta olhar o que está ocorrendo com a Petrobrás, para não falar em outros setores do governo. É a politicagem empurrando o país para o atraso.

2 thoughts on “25 anos que mudaram o país

  1. Com todo respeito Sr. Orlando Barrozo, é triste ver relato neste blog, de forma tão simplista, onde diz que as empresas de telecomunicações que compuseram o sistema TELEBRÁS estejam assim tão menosprezadas. O sistema para quem não conheceu, teve desde sua criação, que organizar e interligar um pais com telecomunicações de norte a sul, leste a oeste. Regiões enormes como pantanal e amazônia tiveram que ser integradas ao restante do país. Até hoje com essa grande maravilha que foi mencionada em seu texto, que foi a privatização do sistema, ainda o Brasil sofre com falta de infra estrutura de telecomunicações, porque a iniciativa privada não investe onde não tem retorno, e isso chega ao ponto de municípios terem que colocar dinheiro público para trazerem alguma operadora para perto deles. Outro detalhe, o Brasil tinha satélites próprios que atendiam todo o território brasileiro e inclusive na área de segurança como as das forças armadas também eram atendidas, e isso passou para a mão da iniciativa privada. Hoje o país paga para ter cobertura de satélites, coisa que já tínhamos. Desculpe por me expressar assim, mas a história é outra. Colocar desta forma que as empresas de telecomunicações daquele época eram local de farra de governantes, não confere muito com o que presenciei convivendo neste meio por mais de 25 anos.

  2. Olá, Getulio. Obrigado pela mensagem, aqui são sempre bem-vindos comentários respeitosos, inclusive as críticas. Talvez meu texto não esteja bem escrito. Não quis dizer o antigo sistema estatal de telecomunicações foi ruim para o país. Longe disso. Acompanhando esse mercado há mais de 40 anos, o que testemunhei foi uma gradativa queda dos investimentos públicos no setor, que acabou inviabilizando empresas como a Telebrás. O Brasil dos anos 60/70 era bem diferente do que é hoje, e o investimento em tecnologia não estava mais acompanhando as necessidades do país. Junte-se a isso as interferências políticas e os inúmeros cabides de emprego que foram criados para atender este ou aquele grupo. Em 1990, o sistema Telebrás – do qual faziam parte as operadoras estaduais, quase todas usadas politicamente pelos governadores de então – já estava exaurido, sem condições de fazer os gigantescos investimentos que eram necessários para modernizar o país. Você deve se lembrar da situação econômica da época, com a dívida externa galopante, assim como a inflação. O modelo estatal teve seus méritos, mas não fossem as privatizações não existiria a cobertura que temos hoje. Isso não significa que a situação esteja resolvida, ao contrário, telecom é um segmento em que a necessidade de atualizações é permanente. E duvido que, hoje, o governo tenha condições que bancar esse jogo. Há muito ainda a fazer em termos de cobertura dos serviços, fiscalização e redução de custos, até porque o modelo de privatização adotado acabou resultando num cartel onde três grandes grupos dão as regras e a Anatel não tem força política (especialmente no governo atual) para defender o consumidor como deveria. Mas essa é outra batalha. Um abraço.

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