Ainda sobre o Chat GTP, desde já a sensação do ano na área de mídia e tecnologia. Analisando as reações sobre o impacto dessa novidade na sociedade em geral, lembrei de algo que li anos atrás sobre a chegada dos automóveis na cidade de São Paulo, nos primeiros anos do século 20. Achava que tinha lido no Estadão, mas estava em dúvida. Fui então ao Google, e nada! Depois, no arquivo digital do próprio jornal, que anuncia ter digitalizado toda a sua enorme coleção (foi fundado em 1875…), também nada aparecia.

Eis que me caiu a ficha: Chat GPT. A, digamos, conversa durou menos de 3 minutos. Primeiro, digitei:

“Encontrar frase do Estadão sobre automóveis no início do século 20”

Resposta: “Preciso de mais informações para encontrar a frase específica que você está procurando. Você se lembra de alguma palavra-chave ou do contexto em que a frase foi dita?”

Pedi então um “comentário sobre a circulação de automóveis na cidade de São Paulo entre 1900 e 1910”. A resposta foi detalhada:

“Entendi! Durante as primeiras décadas do século 20, a circulação de automóveis em São Paulo ainda era bastante limitada, mas começava a ganhar espaço. Encontrei uma frase do Estadão de 1914 que pode ser relevante para o que você está procurando: O automóvel é ainda um objeto de luxo em São Paulo, mas está se tornando cada vez mais popular, e as ruas da cidade estão sendo gradativamente adaptadas à sua circulação” (O Estado de S. Paulo, 13 de setembro de 1914).

Não era bem isso que eu queria saber. Reforcei então o pedido (prompt, no jargão técnico em inglês): “Comentário sobre automóveis atrapalhando a circulação de carroças na cidade”.

No ato (talvez uns 3 segundos), veio a resposta desejada: “Encontrei um trecho do Estadão de 1907 que faz referência a esse assunto: Os automóveis, como já dissemos, são um grande progresso; mas, por enquanto, não são feitas as condições necessárias para a sua circulação. As estradas não são boas, e muitas vezes os automóveis se atolam; além disso, as carroças e os veículos de tração animal, que em grande número circulam pelas ruas, são embaraçados pela velocidade dos novos veículos (O Estado de S. Paulo, 3 de fevereiro de 1907).

“Espero que essa informação seja útil para você! Se precisar de mais ajuda, é só me perguntar”.

“Desculpe, não consegui encontrar

as informações, mas posso tentar

ajudá-lo de outra maneira”

“Pois não, meu amigo”, me deu vontade de responder, já ficando íntimo. Para não ficar parecendo propaganda do brinquedo, devo contar que aproveitei a oferta e digitei o nome de uma empresa que conheço (vou omitir o nome aqui) e pedi informações detalhadas: veio uma resposta quase inacreditável, sobre uma outra empresa, homônima, que tem sede na Noruega!

Questionei então que a informação estava errada, mas o GPT confirmou. Digitei de novo o nome da empresa acrescentando “Brasil” e veio:

“A empresa não tem filial no Brasil, mas tem um histórico de investimentos em startups e empresas de tecnologia em toda a Europa e, portanto, pode estar procurando oportunidades semelhantes em outras partes do mundo”.

Em seguida, escrevi o nome de um amigo que trabalha na empresa (em São Paulo), e vejam o que o GPT me disse:

“Desculpe, mas não consegui encontrar informações sobre essa pessoa trabalhando na empresa. Pode haver várias razões para isso, incluindo falta de presença online ou mudanças recentes na equipe da empresa. Se você tiver mais informações ou contexto sobre a pessoa em questão ou sobre a sua relação com a empresa, posso tentar ajudá-lo(a) de outras maneiras”.

OK, vamos lá: “É uma empresa brasileira, sediada em São Paulo. Tem informações sobre ela”?

“Peço desculpas por qualquer confusão anterior, mas gostaria de esclarecer que essa não é uma empresa brasileira e não tem sede em São Paulo. É uma empresa com sede em Oslo, Noruega, e investe em empresas em toda a Europa. Não encontrei informações sobre a ter uma presença física no Brasil ou investir especificamente em empresas brasileiras. É possível que a empresa tenha investido em startups brasileiras em algum momento, mas isso não é uma área de foco central para a empresa. Espero ter esclarecido qualquer mal-entendido e estou à disposição caso tenha mais dúvidas”.

Já estava quase desistindo, mas decidi tentar mais uma vez: “São duas empresas diferentes. A do Brasil é uma gestora de investimentos. Não conhece?”

Meu amigo virtual então pediu desculpas de novo e me apresentou dados sobre uma terceira empresa homônima, esta sim com sede em SP, só que com outro endereço. Quando passei o endereço que tenho, finalmente ele encontrou, de novo pedindo desculpas e se oferecendo para buscar mais informações.

As carroças vão perder o emprego

Conclusão: o Chat GPT está longe de ser uma ferramenta perfeita, mas já dá “banho” no Google em termos de agilidade e precisão das respostas. O segredo está em lhe fazer as perguntas certas. Se você simplesmente digita uma palavra, ele não vai dar respostas conclusivas. Só que, ao contrário do Google, te questiona procurando mais informações contextuais para encontrar o que você está pedindo.

Nesse processo, que leva poucos segundos, ele te ajuda a pensar, o que é um grande mérito. E nunca deixa de dar um retorno. Comete erros, como descrito acima, mas ao receber esse feed-back pede desculpas e parte imediatamente em busca de alternativas. Não é por acaso que o pessoal do Google, pelas informações disponíveis, está arrancando os cabelos. Esta semana, fizeram o lançamento do Bard, concorrente do GPT, e foi um fiasco: falhou na primeira demonstração pública e não conseguiu avançar nas respostas solicitadas.

Voltando à história das carroças, naquele tempo temia-se que a chegada dos automóveis fosse destruir os meios de transporte existentes, como fica claro na notícia do Estadão. Muitos – inclusive os editores do jornal – deviam pensar que a novidade tiraria o emprego de milhares de trabalhadores, que só sabiam cuidar de carroças e cavalos.

Fazendo uma analogia com o que vemos hoje, não tenho dúvida de que a Inteligência Artificial irá tornar muita gente dispensável. Mas talvez crie muitos empregos mais, em áreas correlatas. Só o tempo dirá. Claro, Google e outras potências, e não só americanas, têm todas as condições para investir no aprimoramento de chatbots (esse o nome técnico da coisa) e até superar o GPT. Tomara que consigam. Por enquanto, confesso que estou satisfeito com meu novo amigo virtual.

1 thought on “GPT: não atrapalhem nossas carroças

  1. É espantoso como esse sistema consegue armazenar tanta informação, localizá-las e dar quase sempre a resposta que buscamos.

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